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26
Dez21

Do amor

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Casaram-se faz hoje 50 anos. E continuam a ser a mais bonita história de amor que conheço.

publicado às 09:31

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Esta ilustração linda é do André Carrilho e foi publicada no DN do sábado passado (espero que ele não se importe que eu a publique aqui).

Eu sei que não sou velhinha de bengala mas já tantas vezes, ao passear pela rua, olhei para os pares de namorados aos beijos nos bancos de jardim, aquela urgência que só tem quem está perdidamente apaixonado, como se os beijos não pudessem esperar, como se tivéssemos que estar juntos, juntos, pele com pele, o máximo possível, como se nada mais à volta importasse, como se nada mais existisse, e eu, passando, olhando para eles e a pensar para mim: lembras-te como era?

Lembro-me bem.

E agora? Irá acontecer-me outra vez?

A acompanhar aquela ilustração, a Fernanda Câncio escreveu um texto muito bonito sobre isto do amor depois de uma certa idade. Ela escolheu os 60 anos. Ainda me falta um bocadinho, é verdade. Mas não consigo evitar sentir-me um pouco retratada. Um dos seus entrevistados diz, a certa altura: "Para mim o desejo está na paixão, e o amor tem sempre de resultar da paixão. Levei a vida a perceber essa coisa que vinha já de Platão e que só a partir do século XX desaparece - que não há um lado animal e racional, e que as coisas estão misturadas em nós. Que a pessoa amada é real, a pessoa que amamos por coisas tão pequeninas como um cheiro ou uma forma de andar. O que é sentir esse amor - não sei responder muito bem, não. É como se os corpos se equivalessem. É um amor de pequeninas coisas quotidianas, de vontade de anichar, de andar de mão dada, de dormir abraçada". 

Outro diz: "Nos últimos dez anos não tive nenhuma paixão. Tive sexo ocasional, tive enfatuações - que é uma palavra que vem do inglês infatuation [neste caso podendo traduzir-se por arroubo, encantamento], que não existe em português mas faz falta, porque não foram paixões." E acrescenta: "A paixão é uma coisa que ocupa muito espaço e tem um potencial de sofrimento imenso. Não sei se quero passar por isso outra vez."

Mas eu ainda acho que quero passar por isso outra vez.

Gostava muito, confesso, gostava muito de encontrar alguém com quem envelhecer. Tranquilamente. Mas feliz e acompanhada.

Quando José Saramago conheceu Pilar, ela tinha 36 anos, ele 64. Ao ver o filme José e Pilar, de Miguel Gonçalves Mendes, e vendo-os tão apaixonados, fiquei animada: é possível, ainda há esperança. 

Admito que à medida que o tempo passa essa esperança vai perdendo fôlego. Parece cada vez mais difícil voltar a apaixonar-me e ainda mais difícil que, apaixonando-me, consiga ter uma relação feliz com alguém (porque uma coisa não leva necessariamente à outra, infelizmente). 

Ainda não desisti. Não é que ande por aí à procura, não é isso que me move, mas não desisti. E sempre que vejo uma hipótese - por muito vaga que seja - não consigo virar-lhe as costas. É assim que sou. Hei de acreditar e tentar e entregar-me e aproveitar todos os momentos bons que houver para aproveitar e depois desiludir-me, espalhar-me ao comprido e sofrer. E hei de repetir tudo de novo se acreditar que vale a pena. E acredito algumas vezes. Sim, o potencial de sofrimento é enorme. Mas...e se? 

Em Call Me By Your Name, de Luca Guadagnino, o pai diz a Elio que a vida é para ser sentida, que de outra maneira não faz sentido: "Os nossos corações e os nossos corpos são-nos dados só uma vez. E antes que dês conta disso, o teu coração está gasto. Quanto ao teu corpo, chega um dia em que ninguém olha para ele, quanto mais chegar-lhe perto".

Quanto ao corpo, é o que é. Mas haverá alguma maneira de evitar que o nosso coração fique gasto?

Mistery of Love, de Sufjan Stevens

 

(uma coincidência de que só me apercebi agora: hoje é 6 de outubro.)

publicado às 11:05

26
Dez19

Do verbo amar

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No outro dia estava a tentar explicar isto ao meu filho: não adianta gostar de alguém se essa pessoa não se sentir gostada. É importante mostrar aos outros o que sentimos. Em palavras, em gestos, em comportamentos. O amor que sentimos só é verdadeiro amor quando chega à outra pessoa. Nem que seja em forma de abraço. Ou de sorriso.

E, pensando bem, também é isso o natal. Um pretexto para dizermos aos outros que gostamos deles. Para nos lembrarmos como isso é importante. Uma prenda é uma maneira de dizer: gosto de ti. Ou: acho que isto te pode fazer feliz. Não tem de se gastar muito dinheiro. Uma prenda é um acto de amor. E é tanto mais especial quanto mais é pensada para aquela pessoa específica. O livro que ela queria ler. O desenho que fizemos. O postal que escrevemos. O abraço que ele precisava. A visita que nunca temos tempo de fazer. O jantar que passamos a vida a adiar. Aquele telefonema. Aquela palavra.

publicado às 17:16

I

No sábado passado, o Expresso publicou um longo artigo da Cristina Margato sobre a infidelidade a propósito de um livro da psicoterapeuta Esther Perel. O tema é fascinante e não é a primeira vez que penso nele. Se perguntarem aos vossos amigos o que é para eles a infidelidade, que tipo de fidelidade esperam de um companheiro, que tipo de infidelidade estariam dispostos a perdoar, verão como cada um dará uma resposta diferente. Tenho falado disto com algumas pessoas - até porque conheço pessoas que já traíram, outras que já foram traídas, conheço casais que estão juntos e felizes na sua monogamia há muitos anos e outros que têm "relações abertas" e também estão contentes, tenho amigos que se divorciaram por causa de traições e outros cujas relações superaram infidelidades. Este é um assunto em que não há respostas certas ou erradas, cabe a cada pessoa (ou a cada casal) encontrar a solução que mais o (s) satisfaz. Seja como for, é um tema sobre o qual gosto de pensar. Até porque pensar estas questões é também pensar como é que uma relação pode durar para além do desejo inicial e do que é que se alimentam as relações longas.

Se quiserem um resumo do pensamento de Perel sobre o assunto podem ver este vídeo:

Do artigo, retirei este excerto, porque faz todo o sentido para mim neste momento:

Algumas pessoas minimizam o envolvimento sexual ou emocional. "Traí, mas foi só sexo", ou "Sim, saímos, mas nunca fomos para a cama". Normalmente os especialistas concordam que, para a maioria dos seres humanos, é difícil separar as relações sexuais das emocionais. Perel garante: "Os casos extraconjugais são menos sobre sexo e mais sobre desejo: o desejo de se sentir desejado, de se sentir especial, de ser visto e de estar em sintonia, de chamar a atenção. Tudo isto carrega uma excitação erótica que nos faz sentir vivos, renovados, revitalizados. É mais energia do que acção, mais encanto do que coito."

II

Também sublinhei uma frase do antropólogo José Gabriel Pereira Bastos, que defende que há dois tipos de pessoas:

As que se focam, e que querem reconstituir o casal parental; e as que nunca se focam, e estas não saíram da idade do jogo. Ou seja, da adolescência. Não querem o compromisso. As que se focam, quando ficam sozinhas, sentem-se mal. Querem um companheiro ou uma companheira. Já as pessoas que permanecem inconscientemente na idade do jogo ficam mal quando arranjam alguém. Começam a ter saudades do tempo em que tinham cinco amigas ou amigos, e em que para ter sexo bastava telefonar. Se não fosse com uma pessoa era com outra.

Nunca o colocaria com estes termos, como é óbvio, mas eu também já tinha percebido mais ou menos isto - porque o sinto na pele. Há pessoas que vivem bem sozinhas. Eu nem por isso. Gosto de ter os meus momentos a sós, claro. Não digo que não aprecie um dia de completo silêncio. E sobrevivo aos dias de folga e aos dias sem filhos porque tenho as minhas estratégias e amigos que me dão colo, e quando tudo o resto falha enfio-me numa sala escura de cinema ou de teatro e espero que o tempo passe. Mas o que mais custa, verdade seja dita, é a solidão que se sente quando não estamos sozinhos. Ou seja. Mesmo quando tenho os putos (o que é quase sempre), eles fazem-me companhia mas não é com eles que converso sobre os meus dramas e os meus sonhos. Não é com eles que desabafo sobre os problemas no trabalho. Não é com eles que me posso sentar a beber um copo e a deitar conversa fora. E mesmo que eles me ajudem no dia-a-dia, não posso contar com eles para me apoiarem nos momentos realmente difíceis. E mesmo que faça com eles os planos para as férias e decida com eles o que vai ser o jantar, não é a mesma coisa do que fazer planos com um companheiro. E mesmo que eles sejam uns queridos e me dêem muitos beijinhos, não é o mesmo de ser abraçada por alguém que me deseja. Portanto, ainda que eu não esteja efectivamente muito tempo sozinha, a verdade é que me sinto muitas vezes só. Não é o fim do mundo, pois não, mas é algo que mexe comigo. E quando a vida nos corre mal de outras maneiras essa falta sente-se mais.

Eu sou mais feliz quando tenho um amor. E gosto de todas as pequenas coisas e cumplicidades e rotinas e lamechices de ter um parceiro. Dos beijinhos antes de adormecer e de lavarmos a louça juntos, de não conseguirmos decidir onde é que vamos jantar e de ficarmos os dois a ler livros numa esplanada sem sequer falarmos um com o outro. Gosto de me imaginar velhinha e ter alguém a quem dar a mão, mesmo que a tremer.

III

Amar e ser amada. Acho que era isso que eu queria. Há quem lhe chame romantismo. Ou apenas estupidez. Mas mesmo que nunca o tenhamos, podemos desejá-lo, não é?

"All I know is that you're so nice
You're the nicest thing I've seen
I wish that we could give it a go
See if we could be something
 
I wish I was your favourite girl
I wish you thought I was the reason you are in the world
I wish my smile was your favourite kind of smile
I wish the way that I dress was your favourite kind of style
 
I wish you couldn't figure me out
But you'd always wanna know what I was about
I wish you'd hold my hand when I was upset
I wish you'd never forget the look on my face when we first met
 
I wish you had a favourite beauty spot that you loved secretly
'Cause it was on a hidden bit that nobody else could see
Basically, I wish that you loved me
I wish that you needed me
I wish that you knew when I said two sugars, actually I meant three
 
I wish that without me your heart would break
Yeah, I wish that without me you'd be
Spending the rest of your nights awake
I wish that without me you couldn't eat
Yeah, I wish I was the last thing on your mind before you went to sleep
 
Look, all I know is that
You're the nicest thing I've ever seen
And I wish we could see if we could be something
Yeah, I wish we could see if we could be something"
 

Nicest Thing, de Kate Nash

publicado às 20:11

"Apesar dos conselhos da filha, que defendia o amor livre, para ela a intimidade era impossível com alguém que se distraísse com outras mulheres. "O que é que queres, mãe? Casar?", gozou Daniela quando soube que a mãe tinha acabado com Julián. Não, mas queria fazer amor amando, pelo prazer do corpo e a tranquilidade do espírito. Queria fazer amor com alguém que sentisse o mesmo que ela. Queria ser aceite sem ocultar nem fingir nada, conhecer o outro profundamente e aceitá-lo assim mesmo. Queria alguém com quem passar a manhã de domingo na cama a ler o jornal, a quem dar a mão no cinema, com quem pudesse rir-se de disparates e discutir ideias. Tinha ultrapassado o entusiasmo pelas aventuras fugazes."

Acabei de conhecer Lucía, 62 anos, no livro Para Lá do Inverno, de Isabel Allende, e já somos amigas.

publicado às 08:32

02
Jul19

Não te demores

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Hoje ensinaram-me um provérbio chinês: "Não semeies o amor onde não possas ficar". A internet não conhece este provérbio chinês. O mais parecido que encontrei foi esta frase - que pode ter sido dita pela pintora Frida Kahlo ou pela atriz Eleanora Duse ou até por outra pessoa qualquer (isto com as citações que se espalham pela internet, assim como com os provérbios chineses, nunca se sabe): "Onde não puderes amar não te demores". No entanto, as duas frases dizem coisas muito diferentes. E acho que esta segunda faz muito mais sentido. Embora tenhamos um poder limitado para decidir quem amamos e muito menos quem nos ama, podemos perfeitamente, e por muito que nos custe, decidir onde nos queremos ou não demorar. 

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publicado às 23:17

21
Jan19

Da empatia

"O amor é paciente, o amor é bondoso. Não inveja, não se vangloria, não se orgulha. Não maltrata, não procura seus interesses, não se ira facilmente, não guarda rancor."

(excerto de 1 Coríntios 13 )

 

Encontrei esta citação num texto da Ana Rute e achei interessante porque este é um daqueles excertos que são muitos usados nos casamentos mas ela usou-o num contexto bastante diferente e continua a fazer todo o sentido. Falava ela dos fardos que cada um tem de carregar e de como é  complicado saber quem é que tem o fardo mais pesado, questionando se temos mesmo que fazer esse tipo de comparações. Eu não gosto muito de me lamentar mas aprendi nos últimos anos que um queixume feito com a pessoa certa (uma pessoa que não nos julga e que não compara fardos, que é como quem diz: um amigo) pode ter realmente a capacidade de nos aliviar. 

Saber ouvir o outro é também um acto de amor. 

Às vezes só precisamos de um colo. E mais nada.

publicado às 22:45

O que eu aprendi nestes últimos anos:

Que não é fácil conhecer pessoas novas.

Que não há assim tantos homens interessantes.

Que não é fácil começar uma relação quando se é mãe a tempo inteiro.

Que às vezes há pessoas que parecem as certas e têm tudo a ver e cumprem todos os requisitos mas... falta aquela coisa básica que é a química.

Que às vezes há pessoas que não têm nada a ver e está na cara que não vai dar certo mas... porra, que vontade de lhe dar beijos.

Que às vezes há pessoas que surgem na nossa vida na hora errada. Pode mesmo ser uma questão de timing.

Que sexo é bom mas não é indispensável.

Que um homem faz mesmo falta é para dar atenção e miminhos e essas lamechices todas.

Que não é fácil ser feliz sozinha. É muito difícil até.

Mas que não estou disposta a aceitar qualquer coisa só para ter companhia. Nem estou disposta a abdicar da minha liberdade nem dos meus princípios nem de outras pequenas e grandes coisas que fui conquistando.

Que não vale a pena procurar.

Que o que tiver que ser será.

E se não acontecer nada, paciência. Vamos ter que aprender a viver com isso.

publicado às 16:03

"If you aren’t able to honestly, openly, constantly communicate with your partner, then nothing else matters. Your actions don’t matter, the sex you have doesn’t matter, the power struggles and the financial strains and the problems with this, that or the other thing don’t matter."

Diz a cantora e activista Amanda Palmer, entre outras coisas fixes, no The Guardian

E já agora fiquem-se com esta dela, The Messy Inside:

publicado às 22:41

As Pontes de Madison County, de Clint Eastwood. Lembro-me de quando o vi pela primeira vez. Já o vi tantas vezes depois disso. Voltei a encontrá-lo agora mesmo na televisão. E parece-me cada vez melhor. 

publicado às 23:12


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