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Quem ganhou? O jornalismo e o comentariado políticos estão reduzidos a isto: quem ganhou o debate? quem ganha nas sondagens (bem ou mal feitas)? quem ganha nas redes? Veja ao minuto, agora, instantaneamente. Não vale a pena pensar muito, nós dizemos-lhe já. E quem ganha nem sequer é quem diz mais verdades ou quem tem propostas mais exequíveis, é quem conseguiu gritar mais alto, calar o adversário, ser mais fanfarrão, dizer a frase mais orelhuda. Quem ganha é quem consegue mais aplausos no Twitter, esse mundinho à parte, onde os jornalistas e comentadores vivem e se degladiam, mas que representa muito pouco do que é o país real. 

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É verdade que já não tinha grandes expectativas sobre o jornalismo que fazemos no nosso dia-a-dia, mas nunca julguei que pudéssemos descer tão baixo como está a acontecer nesta campanha eleitoral. Isto não quer dizer que não haja trabalhos bons, que também os há, atenção. Mas ficam geralmente ofuscados por este festival de comentários e avaliações à la minuta. E é uma pena. Sinto mesmo que não estamos a prestar um bom serviço à democracia - nem aos nossos leitores/ouvintes/espectadores. Mas sinto-me impotente. Limito-me a tentar não contribuir para este barulho.

Infelizmente isto não acontece só em Portugal, felizmente já há muita gente a pensar sobre isto e até já há algumas pessoas a tentar fazer diferente. Através do Jay Rosen , autor do PressThink (só o nome já é bom, juntar imprensa e pensamento é sempre um bom princípio), encontrei este texto, que me parece resumir bem algumas das preocupações que - como descobri recentemente - não são só minhas:

"(...) Horse race political journalism is the shallow end of the craft. It’s easy to do, carries no burden in terms of input or consequence and can spawn a day or so of equally lazy follow ups. It is usually based on polling. A poll of inconsequential quality is used to measure the possible outcome of a looming political contest – usually on the fundamental metrics of voting intention and leadership approval/disapproval. (...) It is always worth remembering and repeating that opinion polling is no more than what it is – the sampling of opinion at a moment in time on a single issue or confined basket of issues. (...) Other factors counting against horse race polling are that it contributes to the prevalent and increasing distrust in politicians – if all the news is focused on the competitive nature of contests and doesn’t delve into the issues voters actually talk about, people will believe politicians don’t care about things like health and education. (...) Pages of stories on horse race aspects of elections and little if any examination of what is at stake in any contest means the voters are ill-informed and slip into not caring. It’s a self perpetuating and self fulfilling problem at once. The ill informed nature of so much political reporting – fed by the horse race obsession – creates an electorate which really doesn’t care because they do not believe anything has any meaning or any election outcome has any consequence. (...) The fundamental criticism of horse race political journalism is the tendency to give emphasis to colour and movement, to drama and shock, over anything or substance or consequence. Substance takes a back seat. (...)".

publicado às 22:31

Tive mais uma vez o privilégio de colaborar com o "Projeto Invisível", a revista sonora da Culturgest. Desta vez, a propósito do espectáculo Na Medida do Impossível, de Tiago Rodrigues, fui à procura de pessoas que trabalham em organizações humanitárias em cenários de emergência, como guerras, catástrofes naturais, epidemias, surtos migratórios. Tive conversas muito interessantes com a enfermeira Catarina e o responsável de logística Luís, da Médico Sem Fronteiras, e com a psicóloga Inês, do Comité Internacional da Cruz Vermelha, que me falaram das dificuldades e dos desafios do seu trabalho e das estratégias a que recorrem para cuidarem de si - e assim poderem cuidar dos outros.

Podem ouvir a aqui reportagem "A Força de Quem Cuida" ou, se quiserem, todo o episódio do "Projeto Invisível".

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Fotografia de um campo de refugiados em Lesbos, na Grécia, em 2019, de autoria de Panagiotis Balaskas - AP Photos

publicado às 17:02

Antes desta semana de caos que agora terminou e do mês de caos que aí vem, o mês de janeiro foi bom para mim. Foi mesmo. Inesperadamente bom por vários motivos, entre os quais estes: consegui ir passar um bocadinho de uma tarde com os meus queridos amigos da Companhia Maior, fui conversar com o Eduardo Gageiro e ver as suas maravilhosas fotografias e ainda ouvi o fantástico Jorge Calado a falar sobre as fantásticas fotos de Maria Lamas - sim, assim mesmo, com adjectivos em excesso para que se perceba que estou a falar de eventos mesmo importantes e - e isso é o mais relevante para o caso - que me deixaram verdadeiramente feliz. 

Os acontecimentos dos últimos dias têm me feito reflectir muito sobre o estado do nosso país e sobre a cada vez maior visibilidade e representatividade da extrema-direita. Para quem, como eu, se revê incondicionalmente nos ideais da democracia, da liberdade, da igualdade e do respeito por todas as pessoas, tudo isto é bastante angustiante e confesso que ainda não encontrei as palavras certas para falar deste tema. É importante ver as fotografias de Eduardo Gageiro e Maria Lamas, falar sobre elas, tentar entendê-las. É preciso não esquecer o que foi a ditadura. O que foi verdadeiramente, sem romantizar. A história ensina-nos muito e manter a memória desperta é mesmo um dos maiores antítodos contra as ameaças que enfrentamos. É preciso não esquecer os que resistiram e lutaram contra a ditadura. Que o seu exemplo nos inspire. E nos dê alento.

Se puderem, não percam estas exposições. Para ver com olhos de ver.

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Mulheres do nosso país fotografadas por Maria Lamas (1948)

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 Polícias batem em manifestantes durante o Estado Novo. Fotografia de Eduardo Gageiro

publicado às 11:24

Chorei copiosamente a ver o documentário 20 Dias em Mariupol, do jornalista Mstyslav Chernov, que retrata a saga da equipa de jornalistas da AP, os únicos jornalistas que ficaram na cidade de Mariupol nos primeiros dias da invasão russa e que se esforçaram para contar ao mundo o que ali se passava. Chorei pelas crianças que morreram, pelos pais em sofrimento, por todas as pessoas com medo. Pelos jornalistas que correram risco de vida. Pelos militares que salvaram os jornalistas porque perceberam a importância do que eles estavam a fazer. "Filmem isto, mostrem ao mundo o que nós estamos a passar", diziam-lhes os médicos. E se não fossem eles, se não fosse a sua coragem, como saberíamos?

 

Não chorei mas foi por pouco a ler Um Dia na Vida de Abed Salam, o angustiante livro de Nathan Thrall , jornalista norte-americano a viver há 12 anos em Jerusalém. O livro conta a história verdadeira de um acidente com um autocarro que, num dia de muita chuva, transportava crianças de uma escola palestiniana para um parque de diversões. Thrall ouviu as muitas versões daquela história. E foi ainda mais longe e quis saber as histórias das pessoas que, de uma forma ou de outra, estiveram ligadas a esse acidente. O pai que perdeu um filho, o condutor do autocarro, a professora que ia com as crianças, a médica que salvou vidas, o bombeiro que apagou o fogo, a enfermeira que não chegou a horas, o urbanista que planeou aquela estrada, o militar que a vigiava. Quase sem darmos por isso a história daquele acidente transforma-se na história da Palestina. 

Desde 7 de outubro, são pelo menos 79 os jornalistas e profissionais de órgãos de comunicação social, a maioria dos quais palestinianos, mortos na guerra entre Israel e o Hamas. Quem irá contar as histórias daquelas pessoas quando não houver mais jornalistas na Faixa de Gaza?

Vejo nas redes sociais muitos comentários de pessoas que desprezam os jornalistas e que dizem que o seu trabalho não serve para nada. Eu também sou muito crítica em relação ao jornalismo que fazemos. Sim, é verdade, há muito mau jornalismo por aí. Por isso é cada vez mais importante preservarmos o bom jornalismo. Fazermos escolhas acertadas. Reflectirmos todos sobre o que andamos aqui a fazer.  Fazermos o nosso trabalho o melhor possível. Porque, não tenhamos ilusões, o mundo será um lugar muito pior e muito mais escuro se (quando) não houver jornalistas. Quando estivermos exclusivamente à mercê de informações enviesadas, não verificadas, falsas, divulgadas sabe-se lá por quem e a servir sabe-se lá que interesses.

Esta semana realiza-se o 5º Congresso dos Jornalistas. Tenho vários mixed feelings sobre o que se passa nos media, não tenho qualquer espírito de classe e há muito tempo que não visto camisolas. Mas paguei a minha inscrição, talvez me apeteça passar por lá. E, por fim, peguei nas minhas dúvidas, fui perguntar a outros jornalistas o que é que eles achavam disto tudo e escrevi um artigo. É a minha singela participação para o debate.

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O jornalista da Al Jazeera Wael Dahdouh chora a morte do seu filho Hamza, que também trabalhava para a Al Jazeera e que foi morto num ataque aéreo israelita em Rafah, Faixa de Gaza, domingo, 7 de janeiro de 2024. Dahdouh já tinha perdido a sua esposa, outros dois filhos e um neto nesta guerra e ele próprio quase foi morto. (Foto AP/Hatem Ali)

publicado às 22:36

É importante estarmos disponíveis para olhar para o outro, para conhecermos o outro, diferente de nós, seja qual for essa diferença, a cultura, o género, a língua, disse o André Tecedeiro numa pequena conversa com o público após uma sessão do filme Orlando - A Minha Biografia Política, de Paul B. Preciado. Gostei tanto deste filme. Desafiado a fazer um filme sobre a sua vida, Preciado respondeu que preferia fazer uma adaptação documental de Orlando de Virginia Woolf. Escrito em 1928, Orlando foi o primeiro romance em que a personagem principal muda de sexo no meio da história. Ou, dito de outra forma, como ele diz no filme, Preciado achava que não havia necessidade de escrever uma nova biografia, uma vez que ela já tinha sido escrita. Como se todas as histórias das pessoas transgénero se misturassem, de alguma forma, com a história de Orlando. Todas são Orlando, embora cada uma à sua maneira. E, assim, em vez de se mostrar a si mesmo, desafiou outras pessoas transgénero a serem Orlando neste filme e a contarem um pouco das suas histórias. Da incompreensão da sociedade aos consultórios dos psiquiatras, da busca incansável (e tantas vezes frustrante) pelo amor, à busca por um corpo a que possa chamar seu (uma cena tão bonita na sala de operações) e ao direito a um nome, ou seja, uma identidade. Que cada um possa ser o que quiser ser, nos seus próprios termos, é de facto uma conquista importante - para cada um de nós, para todos nós, enquanto sociedade. E, no entanto, parece que é (ainda) tão dificil. Tantos passos já dados, tantos passos ainda por dar. 

A propósito: 

Uma entrevista do Paul B. Preciado em que ele explica a ideia para o filme.

"Este é o meu corpo", uma reportagem do meu colega Wilson Ledo sobre algumas destas questões.

Falei com a Maria João Vaz, a propósito do livro de memórias que publicou, e fiquei desarmada com a sua honestidade e felicidade.

Sobre este tema, Girl - O Sonho de Lara é um filme de 2018 de Lukas Dhont que me perturbou muito quando o vi, por todo o sofrimento que vemos na protagonista. Está disponível no Filmin, tal como outro filme de Dhont, que não é sobre pessoas trans mas continua a ser sobre a importância de podermos ser quem somos e sobre a pressão que a sociedade exerce sobre todos nós para nos "conformarmos" à norma: Close esteve nomeado para o Óscar de Melhor Filme Internacional e é tão belo quanto triste.

publicado às 20:05

Não sei bem que dizer. Quando o terror é imenso perdemos as palavras, não é? Nestes últimos dias tenho tentado fazer algumas leituras, preencher algumas lacunas que ainda há pouco admitia aqui, quando escrevi sobre a Golda. Ainda assim, tudo o que possa dizer é de uma enorme banalidade. Toda a violência é terrível mas a violência sobre civis, inocentes, é sempre pior. Porque odiamos?, volto a perguntar. Não tenho respostas. Surpreendem-me muito as pessoas que tomam posições muito convictas sobre este conflito (e sobre outros também, mas sobre este especificamente). A mim sobram-me as dúvidas. 

Deixo algumas pistas:

Falei com a Nofouz, 23 anos, estudante de medicina, da Cisjordânia. É só um lado da história, claro. A mim tocou-me muito.

Uma fotogaleria da Palestina antes de ser Israel, que me fez olhar para trás. As fotos são maravilhosas mas o que ali está é o retrato de uma região colonizada.

"Somos todos animais", um texto da Alexandra Lucas Coelho, que tem dito coisas que me fazem muito sentido.

A Isabel Lucas escolheu alguns livros que poderão ajudar a entender o que se passa na Palestina. Também há uma selecção de filmes, escolhidos pelo Palestine Film Institute.

Também podem ir (re)ler e (re)ouvir a série de reportagens que o Fumaça fez em 2017: "Palestina: Histórias de um país ocupado".

Com tantas imagens horríveis que nos chegam, lembrei-me da Susan Sontag e do seu "Olhando o sofrimento dos outros". Nunca o li todo, confesso, talvez seja este o momento certo.

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Palestinianos procuram sobreviventes após mais um bombardeamento na Faixa de Gaza (AP Photo/Abed Khaled)

 

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"Tragam-nos para casa". Em Telavive, uma mulher apela à libertação dos reféns israelitas (AP Photo/Petros Giannakouris)

 

(e, não sei se repararam, mas de repente deixámos de falar da Ucrânia. a guerra continua lá mas é como se já não estivesse a acontecer. isto devia tanto fazer-nos reflectir.)

 

publicado às 11:29

“Eu acho que as coisas estão a mudar, mas depois dou três passos fora da minha bolha e vejo que ainda está tudo longe do ideal, não sei se a sociedade efectivamente está a mudar.”

As palavras do Mário são certeiras. Porque escolhemos bem as nossas relações, pertencemos a um grupo restrito de pessoas que acredita que a mudança está a acontecer. Que há cada vez menos machismo, menos misoginia, menos homofobia, menos racismo, menos xenofobia, menos discriminação e menos preconceitos. Mas iludimo-nos. Basta uma viagem a essa lixeira que são as caixas de comentários dos jornais online para perceber que estamos muito longe dessa mudança. Aconteceu-me recentemente, primeiro com a entrevista ao Mário, que foi insultado de tudo e mais alguma coisa só por pintar as unhas e fazer tricot, e depois com um outro artigo sobre um novo projecto feminista, cujas fundadoras foram apelidadas de radicais, acusadas de não terem homem e mandadas para casa lavar a loiça, entre outros mimos. Como é possível? 

Tenho muita dificuldade em lidar com esta realidade. Quero ficar na minha bolha. No meu cantinho de tolerância e empatia. Mas, por outro lado, não consigo ficar completamente fora do mundo, nem que seja porque (oh, que pretensão a minha) sinto que temos todos de fazer alguma coisa para impulsionar a mudança, ainda que pequena. É uma questão de cidadania. Não podemos passearmo-nos por aqui como se tudo isto, só porque não nos afecta directamente, não tivesse nada a ver connosco. 

Na falta de melhor, continuo a falar e a escrever. São só palavras. Uma arma fraquita, mas é o que temos.

publicado às 10:41

Um post para correr atrás do prejuízo. Porque não quero esquecer algumas das coisas boas que têm acontecido.

Dois filmes

Aftersun é uma pequena maravilha. Trata-se da primeira longa-metragem de Charlotte Wells, que, aparentemente, se inspira em parte na sua infância. A ação passa-se talvez nos finais dos anos 90 ou início dos 2000 (estou a calcular, pela banda sonora, que inclui a Macarena e os Blur). Um pai (Paul Mescal, que conhecemos de Normal People), recentemente divorciado e a braços com vários problemas materiais e emocionais, leva a filha de onze anos (Frankie Corio) para umas férias de verão num resort turístico na Turquia. As conversas entre eles são deliciosas, os silêncios ainda mais. Não sei se foi por ter essa experiência, de passar tanto tempo com os meus filhos, sem mais adultos por perto, mas emocionei-me muito porque sei bem o tanto que ali se passa, naqueles silêncios, em que pai e filha partilham cumplicidades e cuidam um do outro, com pequenos gestos, pequenos nadas que são tudo. 

No dia em que fui ao cinema ver Ursos não há, o realizador iraniano Jafar Panahi encontrava-se preso desde julho do ano pasado. Foi libertado dias depois, a 4 de fevereiro. Tal como tem vindo a fazer, Panahi continua a trabalhar a autoficção, apresentando-se a si mesmo no ecrã e às dificuldades que enfrenta como realizador num país onde não existe liberdade de expressão e que, além disso, se rege por tradições ancestrais, patriarcais e castradoras. A vigilância não é só policial, é também exercida pela comunidade. Estas circunstâncias levam-no a interrogar o seu trabalho, a importância das imagens e o papel do cinema. Ursos não há, mas as ameaças e o medo podem ser reais.

Dois livros

Com Nora Webster, de Colm Tóibin, conheci uma mulher que fica viúva e de repente se vê sozinha a braços com a vida e os filhos. A ação passa-se em Enniscorthy, na Irlanda, no final da década de 60. Mas podia ser aqui e agora (houve ali momentos - por exemplo quando, cheia de sentimentos de culpa, ela tem de deixar os filhos pequenos desacompanhados durante algumas horas para ir trabalhar - em que podia perfeitamente ser eu). Nora procura o seu próprio caminho, sem medos. Isso implica tomar decisões que vão parecer aberrantes vistas de fora. Tem de libertar-se das suas obrigações perante a comunidade, do peso da religião, do enorme fardo das aparências. Às vezes, temos forças que nem sabíamos que tínhamos. 

Shuggie Bain, de Douglas Stuart, chegou-me através da Sónia, que me assegurou que tinha sido um dos melhores livros que já tinha lido. É, de facto, muito bom. Um mergulho de cabeça nas dificuldades das classes mais baixas de Glasgow, na Escócia, nos anos 80. A miséria contada a partir da história de um miúdo, Shuggie Bain, que cresce a assistir à luta da mãe, Agnes, contra as injustiças do mundo, contra os homens que a exploram e contra o vício do álcool. E que ao mesmo tempo vive também a sua própria luta, a tentar perceber porque é que não é como os outros rapazes. Da alegria de comer um chocolate à tristeza de não ter mais o que comer. Maravilhosamente escrito, com pormenores que nos vão fazer chorar mas também sorrir, que às vezes me fizeram sentir uma enorme revolta. O livro foi o vencedor do Booker Prize em 2020 (e acho que tem tudo para vir a ser um filme).

Dois espectáculos

Onde é que eu ia?, monólogo de Nuno Artur Silva (na verdade, não é, está lá o António Jorge Gonçalves, a dialogar com desenhos, mas, vá), espécie de stand-up comedy mas num tom e num ritmo muito próprios, humor umas vezes mais aguçado, noutras mais light, umas vezes mais confessional, noutras mais desbragado. Gosto muito de ouvir pessoas inteligentes, mais ainda se forem capazes de rir de si mesmas. 

Massa Mãe, espectáculo da minhota Sara Inês Gigante, com a amiga também minhota Carolina Vieira, uma viagem pelas suas memórias de criança, passando pelas brincadeiras com a cadela Pancas, as festas da Senhora da Agonia, o ouro pendurado ao pescoço, os lenços dos namorados, o fato da avó Cândida e os conselhos da tia Maria. E as perguntas todas que surgem quando olhamos para as tradições. A vida é como o ciclo do pão de milho - semea-se, cuida-se, apanha-se, desfolha-se, mói-se, amassa-se, coze-se, come-se. Mas, tal como com a "massa mãe", deixamos sempre algo para os que vêm a seguir.

Vendo bem, são duas criações em modo "a minha vida dava um espectáculo". Cada um à sua maneira. E também por isso - porque sou esta pessoa que se pensa e se narra e se questiona e se memorializa por aqui - me agradaram tanto e me levantaram tantas questões.

Duas reportagens

"Estou a lutar pela vida e agora vou falar de sexo?" Após o diagnóstico de cancro, os doentes experienciam geralmente uma diminuição da líbido, o que se agrava com os sintomas da doença e, depois, os efeitos dos tratamentos. Na maioria das vezes, vivem com este problema em silêncio, têm vergonha de falar do assunto com os médicos pois temem que as outras pessoas achem que não é adequado pensar em sexo quando se está em risco de morrer. 

Na Mouraria, uma cama num quarto partilhado por seis pessoas pode custar 200 euros. Andei pelas ruas dos bairro, acompanhada pela Farhana, a tentar perceber as dificuldades dos imigrantes que ali moram. “Se as pessoas vivem em condições tão miseráveis é porque não têm alternativas”, disse-me o Farid. Se a habitação é um problema tão grande na nossa sociedade actual, imaginem para aqueles que acabaram de chegar a um país novo, que não têm rede de apoio nem falam a língua, que podem até não ter um trabalho nem documentação legal.

Mouraria_019.JPG Fotografia de Rodrigo Cabrita

publicado às 09:47

Há pessoas que sonham com o estrelato. Em aparecer à frente das câmaras. Dar a cara. Já eu sou feliz nos bastidores. Neste final de ano, tive o privilégio de trabalhar com a Anabela, ajudando-a a fazer pesquisa e a preparar as entrevistas do Calendário do Advento. Uma dupla felicidade. Primeiro, por tudo o que aprendi sobre todos os entrevistados. Depois, por, a cada programa, perceber de que forma ela usava (ou não usava) a informação que lhe dava e como conduzia as conversas, escapando ao óbvio e procurando novos caminhos.

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Aqui, num dia em que fui espreitar as gravações, com o Sandro e o Jorge Feliciano, os entrevistados do último programa, que vai para o ar esta noite, véspera de natal. 
Se não viram, vão sempre a tempo de ver o Calendário do Advento, da Anabela Mota Ribeiro, na RTP Play.

As fotografias são da Estelle Valente.

Para me lembrar porque é que gosto tanto de fazer o que faço.

publicado às 10:17

Há um ano começou a CNN Portugal. Tem um sido um ano de aprendizagens e acertos, para todos. Para mim também. Há dias em que questiono se ali é meu lugar, e depois há dias assim, como este, em que me meti no carro com o Rodrigo Cabrita e, desafiando a chuva, fomos à procura de histórias para contar. Levámos com muitos nãos mas também encontrámos pessoas muito bonitas. No fim de contas, é isto que vale a pena.

Ora vejam:

Akash quer ter uma casa para trazer a família do Bangladesh. Rajendra gosta de ir à praia. Masum conta os dias que faltam para ter os "papéis". Mas tudo é difícil para os imigrantes em Odemira.

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publicado às 12:55


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