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25
Mai08

Crescer

Quando o deixei no sábado à tarde em casa da avó era ele ainda um bebé. Voltas quando eu acordar da sesta?, perguntou-me, já nas escadas e de lágrima no olho. Volto, respondi, sabendo perfeitamente que estava a mentir. Não voltei. No dia seguinte, quando entrou na enfermaria engolindo tudo com aqueles olhos curiosos, era já o irmão mais velho. O mano? Onde está o mano? Subiu para cima da cama, quis ver, mexer, abraçar, sempre com um sorriso na cara. Inspeccionou-lhe a boca para verificar que não tinha dentes. Agarrou-lhe a mão e deixou-se agarrar pela mão pequena do bebé. Riu-se do tamanho dos pés. Posso segurar? Estes têm sido dias de adaptação para todos nós. Especialmente para ele. Tão depressa o apanho a olhar para o berço com ar deliciado como parece uma peste que não pára de correr e de fazer barulho, sobretudo quando lhe pedimos para ter cuidado. Quer ajudar a trocar fralda, quer abrir os olhos do bebé, pergunta todos os dias se o umbigo já caiu, vem deitar-se ao meu lado quando estou a amamentar e até já pediu para provar o leite. Faz birras por coisas de nada. Arma-se em parvo. Pede-me colo. Enxota-me com um safanão. O normal, portanto. E nós a tentar fazer as coisas certas, a dar-lhe um desconto mas sem querer ceder a todos os caprichos, procurando manter as rotinas quando ainda não sabemos exactamente como vão ser as novas rotinas. Não deve ser fácil perder assim o protagonismo. Aprender a partilhar o colo e a atenção dos pais. Não é fácil para nós porque haveria de ser para ele? Eu sou o irmão mais velho, não é?, pergunta repetidamente, como se quisesse ter a certeza que nada nem ninguém lhe vai roubar esse lugar, se já não é o único que seja ao menos o primeiro, eu também já fui assim pequenino,não fui? Foi mesmo. Olho-o e quase não o reconheço. Está cada vez mais alto, mais desenvolto, as mãos enormes (como é que eu nunca tinha reparado naquelas mãos tão grandes?), os pés gigantes, um corpo que já mal consigo agarrar por inteiro, o olhar velhaco de rapaz, já não de bebé, um matulão, é o que é. Foi preciso ter agora ali uns quatro quilos de gente num berço para perceber que este, este que sempre foi o pequenino, o franzino, o magrela, é afinal um desempoeirado rapaz de quatro anos. Cada dia mais autónomo. Mais ele mesmo. Cada dia mais independente de mim. Temos crescido todos muito nesta última semana.

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publicado às 14:54


6 comentários

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SMS 26.05.2008

Que lindo texto... É quando leio textos assim, escritos por ti, que penso que algo vai muito mal no jornalismo português para que não estejas devida e dignamente aproveitada. Lindo!

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