A minha casa é como uma praça de touros. Do lado da cozinha bate o sol e o calor não se aguenta. Do lado da sala corre uma aragem fresquinha que nos faz espirrar.
Às vezes os domingos acordavam com o cheiro doce do meu pai a fazer fatias de ovos. Era assim que se chamavam lá em casa. Fatias de ovos. Aproveitavam-se os restos do pão da semana, já duro, que se partia às fatias, depois embebidas em leite, passadas por ovo e, finalmente, fritas em óleo. Já na travessa polvilhavam-se com açúcar e canela. Como eu gosto de canela!, para mim quanto mais canela melhor. Eu acordava e lá no meu quarto sentia o cheiro dos fritos quentes, descia as escadas a correr, abria a porta da cozinha e encontrava o meu pai de volta do fogão com o avental à cintura. As fatias de ovos devem comer-se ainda mornas, quando estão moles, quase a desfazer-se. Eu bebia um copo de leite e comia até ficar com açúcar no queixo, nas bochechas, na ponta do nariz. As mãos peganhentas. O pijama já sujo. E mesmo depois de lavarmos a loiça e limparmos tudo ficava, durante todo o dia, aquele cheiro açucarado na cozinha. Um cheiro a domingo.