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O cheiro de um bolo no forno.
Há trabalho a fazer. Há filhos para criar. Há jantares para cozinhar. Há bolos para preparar. Há colos para dar. E birras a tratar. Há filmes para ver. Há livros para ler. Há sonos para dormir. Há sorrisos para distribuir. Há aviões para apanhar. Há amigos para abraçar. Beijos para dar. Há planos a fazer. E sonhos para sonhar. E enquanto ando assim ocupada a viver a vida até pode acontecer-me (e acontece) ser feliz. O que é que se pode pedir mais?
Acho que em pequena, como todas as meninas, em algum momento devo ter querido ser bailarina. A minha madrinha ofereceu-me um livro sobre ballet e eu devorei-o e reli-o e folheei-o vezes sem conta, fascinada com a leveza daqueles corpos, com os voos, com a beleza. Ainda tenho esse livro e continuo a achá-lo lindo. Gosto de ballet, mesmo quando (sobretudo se) é dançado com botas ou com pés descalços, quando não tem tutus nem meninas em plié, quando já não se chama ballet mas dança.
Há um ano, há exactamente um ano, estava tudo tão diferente. Tudo. Aquilo que era, aquilo que ia ser, aquilo que seria de facto. Havia pessoas a chegarem e pessoas a partirem, e, entretanto, as pessoas que chegaram já partiram e as pessoas que partiram já voltaram, e aquilo que eu achava que ia ser já não é, e aquilo que eu não achava aconteceu. Era tudo tão diferente do que é hoje. Eu estava tão diferente. E, vai-se a ver, há um ano, eu publiquei isto. Há exactamente um ano. E é isto, exactamente isto, que está a dar agora mesmo na televisão. Estava tudo diferente e no entanto.
Descobrir às seis e meia da tarde que temos um jogo do benfica à porta de casa.
Para uma descrente, como eu, ir à missa é sempre uma incógnita. Há dias em que tudo aquilo me parece absurdo e sem sentido e pergunto-me mil vezes o que faço ali todas as semanas. Há dias em que me emociono com uma palavra ou com algum cântigo ou apenas com as vozes em uníssono e com aquela sensação de que se estivermos juntos isto (isto, quero eu dizer, o mundo) há de fazer algum sentido. Há dias em que trago coisas para pensar. Outros não.
Hoje falou-se do perdão. Da importância de amar aqueles que nos fizeram mal. De termos paciência com os que nos importunam.
Eu achava-me uma pessoa capaz de perdoar. Eu era mesmo capaz de perdoar. Não tenho paciência para ficar chateada com quem me fez mal. Não tenho feitio para guardar rancores. Sinceramente. Prefiro mil vezes esquecer. E consigo fazê-lo sem esforço. Sejam coisas de nada ou ofensas graves. Não quero saber. Sou da turma dos abraços, como dizia o Cazuza. E dos sorrisos. Mas, percebi recentemente, se é fácil perdoar os que me magoam é muito mais difícil perdoar aqueles que fazem mal aos meus filhos. É difícil, tão difícil, muito difícil, quase impossível. Descobri-me mãe leoa. Fera que defende as crias até ao limite das suas forças. De forma algo irracional até. E em vez de perdoar sinto um ódio enorme. Isso não faz de mim lá muito boa pessoa.
E, daí, se pensarmos bem, se calhar nem todos merecem o nosso perdão.