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Julho. Tivemos os nossos dias de praia, poucos mas bons. Depois os miúdos também tiveram os seus dias de praia. Mandam-me fotografias repletas de céu azul e sorrisos rasgados. Estão enormes. Como crescem os filhos quando estão longe de nós. Temo que no regresso já não me caibam nos abraços que lhes quero (preciso) dar. A parte boa de os filhos estarem de férias sem mim é que, apesar de estar a trabalhar, tenho tempo de sobra para fazer as minhas coisas sem sentimentos de culpa nem pensar no que vai ser o jantar. Coisas como ficar horas sentada no sofá a ver os jogos olímpicos. Ou jantar com amigos. Ou ir fazer um workshop de cozinha do Médio Oriente no Mezze. Ou não fazer nada. Ou isto:

Dois espectáculos 

À Primeira Vista, texto de Suzie Miller, encenação de Tiago Guedes, interpretação de Margarida Vila-Nova. Sobre isto de ser mulher, as agressões sexuais a que estamos sujeitas, o machismo da sociedade em que vivemos mas, sobretudo, do sistema judicial. As estatísticas dizem que uma em cada três mulheres já sofreram algum tipo de agressão sexual. Então, porque continuamos a tratar assim as vítimas? Porque continuamos a duvidar das suas palavras? A menosprezar o trauma que sofreram? A dar o benefício da dúvida aos agressores? Oh, coitado, foi só um deslize, tinha bebido de mais, ele no fundo não é má pessoa. O texto é muito bom. A Margarida Vila-Nova aguenta-se à bronca. O resultado não é uma obra-prima mas é bom. E importante. Depois de uma primeira temporada esgotada, o espectáculo vai voltar ao Teatro Maria Matos de 18 de setembro a 27 de novembro.

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Madrinhas de Guerra, de Keli Freitas. Uma reflexão sobre o colonialismo e o modo como, em 2024,  ainda romantizamos as "descobertas" dos portugueses que "deram novos mundo ao mundo" e a guerra onde tantos rapazes morreram e sofreram em nome de um império que não era seu. É um olhar inquiridor mas ao mesmo tempo com sentido de humor. Um espectáculo que parece estar inacabado, que levanta mais perguntas do que dá respostas, que nos deixa com vontade de mais. Vi-o no auditório do Museu de História Natural e só isso já foi uma experiência. Se o voltarem a encontrar por aí não percam.

Um livro

Tudo é rio, de Carla Madeira

Preparem-se para todo o balanço e toda a doçura que o português do Brasil nos pode dar. Porque há sotaques que parecem perfeitos para contar o amor (e desamor) e o desejo. Esta é a história de um improvável trio amoroso, a prostituta Lucy, o instável Venâncio e a doce Dalva, mas é também a história das suas famílias, das dores que trazemos connosco e da importância de procurarmos a alegria contra todas as evidências em contrário. Uma delícia.

Um filme

Memória, realizado por Michel Franco, com Jessica Chastain e Peter Sarsgaard. Um encontro improvável entre uma mulher que luta para sobreviver ao trauma (outra vez uma agressão sexual e todas as suas consequências) e manter-se longe do álcool e um homem que sofre de demência e está a perder a memória. Uma batalha entre aquilo que queremos recordar e aquilo que gostaríamos de esquecer. A alegria (a tal alegria) de descobrir o amor confronta-se com as dificuldades da vida real. A verdade é que todos precisamos de quem cuide de nós.

Uma série

Nem uma mais, série espanhola na Netflix, sobre como a violência sexual está presente no dia a dia de um grupo de amigas no liceu (outra vez, sim, juro que não foi de propósito, mas é um tema mesmo importante, ainda bem que se fala disto). Um namorado, um amigo, um professor, qualquer um pode ser um abusador. Mais uma vez, não é uma obra prima, mas é uma série muito bem feita, as miúdas são fantásticas e tenho a certeza que muitas de nós se vão relacionar com aquelas situações. 

publicado às 12:08


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