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As mulheres passam muito tempo a falar sobre o seu corpo, sobre os defeitos do seu corpo, sobre o que têm de fazer para melhorar o seu corpo. Reparei nisso em todos os meus grupos de amigas, não é uma coisa que afecte mais umas do que outras, é geral. Gordura, peso a mais, celulite, rugas, peles flácidas, pêlos, de tudo isto as mulheres se queixam. Olham-se ao espelho e vêem mil falhas. Eu é as ancas, eu o rabo, eu as pernas, eu a barriga, as mamas que são pequenas ou que são grandes demais. Até mesmo as que têm tudo no sítio insistem em encontrar imperfeições. As mulheres planeiam dietas e exercício físico, discutem métodos, trocam experiências, menus e receitas, beber muita água, fazer jejum intermitente, eliminar os hidratos, contar as calorias, correr quilómetros, ir ao ginásio, contratar um PT. As mais determinadas ponderam consultas com médicos diversos, comprimidos milagrosos, intervenções cirúrgicas. É uma tarefa sempre em progresso. Marca-se um jantar e em algum momento o assunto aparece. Há sempre alguém que não vai pedir sobremesa, que não pode comer pão ou batatas fritas ou arroz, ou que avisa que vai comer mas só porque é um dia excepcional, o meu dia da asneira. Há sempre alguém a precisar de se controlar, de fechar a boca, para, definitivamente, emagrecer. É esse o objetivo. Emagrecer. As mulheres querem-se magras.
Não estou a criticar as outras mulheres, atenção. Eu não sou excepção. Eu também sou em parte assim. Eu também queria ser magra. Eu também odeio os mil defeitos do meu corpo. E há momentos em que odeio todo o meu corpo. Eu também morro de vergonha ao ir à praia, sinto-me meia desconchavada ao vestir um biquíni, odeio comprar roupa porque concluo sempre que nada me serve e tudo me fica mal e, como é óbvio, morro de medo que os homens não gostem de mim por me acharem feia e gorda. Essa sou eu no meu dia-a-dia, com a auto-estima bem lá em baixo.
A única diferença é que eu combato esta vergonha do corpo de uma maneira muito peculiar (reparem na palavra, eu não digo que é a maneira certa, é só a maneira que eu arranjei para lidar com isto e tentar sofrer o mínimo possível). Nunca fiz uma dieta nem nunca tive um plano de exercício destinado a melhorar o meu corpo. A batalha acontece toda dentro da minha cabeça. É uma batalha enorme entre todos os meus traumas de mulher, todos os ideais de beleza que me foram inculcados e todos os estereotipos que se entranharam em mim desde que nasci e dos quais, por muito que queira, não consigo fugir, e aquela certeza, que fui adquirindo, conscientemente, deliberadamente, de que um corpo é só um corpo, que este corpo, que é meu e do qual não me posso livrar, que é na verdade aquilo que tenho de mais irredutível, não pode, apesar disso, ser o que me define. Que eu sou muito mais do que um corpo. Que qualquer mulher é muito mais do que um corpo.
É uma batalha, digamos assim, entre sentimentos e razão. Racionalmente, eu estou-me nas tintas para o corpo e sei que não é isso que importa, mas no fundo, lá bem no fundo, sou uma fútil como todas as outras.
Portanto, se estiver vestida, se estiver feliz, se estiver bem com a minha vida, consigo ser super-racional. Sinto-me invencível, quero lá saber de como é que deveria ser o meu corpo. Mas quando estou mais exposta, quando algo corre mal, nos momentos em que me sinto mais frágil por algum motivo, é como se o meu corpo passasse a pesar mais vinte quilos, sinto-me miserável, não tenho dúvidas de que sou uma baleia e de que nunca ninguém (leia-se, um homem) vai alguma vez gostar de mim.
É que, depois, ainda há isto, temos de reconhecê-lo, somos todas mulheres modernas e emancipadas e preocupamo-nos com o nosso corpo não por causa dos outros mas porque queremos ser saudáveis e sentirmo-nos bonitas para nós (se eu não gostar de mim, quem gostará?, não era assim o anúncio?), mas a verdade é que é muito mais fácil gostar de nós próprias quando há alguém que também gosta e nos mima e nos diz que somos maravilhosas. A minha luta, muito pessoal, também passa por aqui.
Como vêem, não é fácil estar dentro da minha cabeça. Está cheia de contradições e de coisas de que não gosto mas que não consigo evitar. Acho que já tinha explicado mais ou menos isto antes. Este também é um trabalho em constante progresso. Acredito muito que ter consciência das nossas falhas é um passo importante para melhorarmos.
Por isso, hoje, só porque sim, avanço mais um pouco nesta auto-terapia, dizendo: este é o meu corpo.
A foto foi tirada pela Filipa num dia feliz. Encolhida, claro, para esconder as banhas. Mesmo assim, jurei que nunca a mostraria a ninguém. Mas agora achei que era ideal para acompanhar este texto, em jeito de perde a vergonha e assume os teus podres e os teus quilos, só possível graças às conversas recentes com a Ângela e com o Tiago que, cada um ao seu jeito, me fizeram perceber o quanto ainda tenho por andar neste processo de auto-aceitação e auto-estima.
Isto sou eu a aprender a ser feliz no meu corpo.
E a rir, pelo caminho.
(oxalá não tropece e me espatife toda)
O meu pai mandou-me esta foto em jeito de prenda de anos. Há 46 anos eu era assim, pequenina e tranquila ao colo da minha avó.
Agora já não sou pequenina. Mas estou tranquila.
Este foi um fim-de-semana cheio de emoções. Um confinamento. Um despedimento. Um aniversário. E uma bela TPM. A tempestade perfeita. E, afinal, correu tudo bem. Pela primeira vez desde que me lembro não fiz nenhum bolo mas tive dois bolos deliciosos. E, de longe ou de perto, tive muitos abraços. Porque tenho amigos dos bons (os amigos salvam-me todos os dias, já o sabia, e posso sempre recorrer a um texto lamechas lido na adolescência e trazê-lo para aqui e está tudo certo). E, para terminar em grande, levei os meus filhos a ver todas as coisas maravilhosas e só o facto de termos ido e de eles terem gostado (principalmente o adolescente) foi maravilhoso.
Nem de propósito, uma das músicas do espectáculo é esta, do Jorge Palma, que cantei em coro com o Ivo Canelas e as lágrimas a embaciarem-me os óculos.
Acho que é mesmo a música perfeita para hoje.
"Tira a mão do queixo não penses mais nisso
O que lá vai já deu o que tinha a dar
Quem ganhou ganhou e usou-se disso
Quem perdeu há-de ter mais cartas pra dar
E enquanto alguns fazem figura
Outros sucumbem à batota
Chega aonde tu quiseres
Mas goza bem a tua rota
Enquanto houver estrada pra andar
A gente vai continuar
Enquanto houver estrada pra andar
Enquanto houver ventos e mar
A gente não vai parar
Enquanto houver ventos e mar
Todos nós pagamos por tudo o que usamos
O sistema é antigo e não poupa ninguém
Somos todos escravos do que precisamos
Reduz as necessidades se queres passar bem
Que a dependência é uma besta
Que dá cabo do desejo
A liberdade é uma maluca
Que sabe quanto vale um beijo"
Um exercício narcísico para começar o ano. Não foi fácil encontrar fotos em que estou sozinha, mas lá consegui. Aqui estou eu, de dez em dez anos, sem filtros.
1980 (just a kid):
1990 (não devíamos guardar fotos da adolescência, pois não?):
2000 (os gloriosos 20s, quando ainda acreditávamos que tudo era possível):
2010 (devem ser as únicas fotos minhas em todo o ano, estava muito em modo mãe e de certeza que nestas fotos estou a olhar para os miúdos):
2020 (rugas e sinais, mas continuo a olhar para eles):
Não gosto nem desgosto de fazer anos. Não me incomoda isso dos anos que passam, mas nunca me apetece festejar. O que é estranho porque eu gosto muito dos aniversários das outras pessoas e de dar miminhos e de ir às festas delas. No entanto, tirando a festa dos 40 porque eram 40 e fazia sentido naquele momento fazer uma festa, sempre que posso no meu dia de anos vou para longe e estou apenas com a minha família. Nas outras vezes fico por cá e a única coisa que tento é não ir trabalhar para não ter que estar com pessoas de que não gosto e para não me irritar. Se for assim já é bom. Acabo por estar, ao longo do dia, com uma ou outra pessoa que aparece ou que se proporciona, sem grandes planos, sem grandes expectativas. Peço aos meus amigos que tenham paciência. Que não se aborreçam. Continuo a gostar de todos vocês e gosto muito de saber que também gostam de mim. Festejamos sempre que nos encontrarmos, combinado?
São 45 anos. Já sou uma senhora. Mas não sou.
Espero que pensem em mim quando ouvirem ESTA música.
ESTA é a foto que resume quase tudo.
E o resto é mais ou menos assim:
Frank Sinatra, That's Life
Encontrar todos os dias um motivo para rir.
"Quando dizem que a idade está na cabeça, meu fígado e minha coluna dão uma risadinha sarcástica."
Rita Lee, quase 70 anos e muito "rockenrou", conta as suas memórias numa autobiografia sincera e divertida que é agora editada em Portugal.
Os Trovante foram o primeiro grupo que vi ao vivo, um concerto ao ar livre numas férias em família, em Lagos, era eu uma miúda. Com os anos fomos todos ficando fartos daquele "tu tu ru ru ru" mas esta versão de 125 Azul é, na verdade, bastante audível - eu tirava ali uns gritos da Lúcia Moniz e aquele olhar profundo do João Gil também era perfeitamente dispensável, mas pronto. O Carlão é o maior e tem uma voz do caraças. E, além disso, está a envelhecer como todos nós, está a engordar e até já tem duplo queixo.
Por mim, tinha ido ao Piódão com a minha família e tinha sido o aniversário perfeito. Às vezes não acreditam, mas eu não sou uma pessoa de fazer festas. Sou uma pessoa de ir a festas, convidem-me que eu adoro. Mas organizar uma festa para mim é algo mesmo muito raro na minha biografia. Mas umas amigas começaram a chatear-me, que devia combinar qualquer coisa e porque é que não fazia uma festa e não sei quê. Ou então eram elas que estavam preocupadas comigo, com medo que me desse um ataque de nostalgia quando chegasse a casa depois do passeio. Pelo sim, pelo não, decidi convidá-las para virem cá a casa. Mas a minha casa não é lá muito grande e eu ainda assim tenho algumas amigas e, mesmo reduzindo os convites só a raparigas, comecei a stressar pois não conseguia decidir quem é que ia deixar de fora. E foi assim que uma coisa que não era nada passou a ser um fim-de-semana inteiro de festa. Primeiro, no Piódão com a minha maninha. Depois, chegar a casa às cinco tarde e tratar de fazer um bolo e outras coisas para receber um grupo de amigas ao serão. E, por fim, no dia seguinte, feriado, fazer outro bolo para um lanchinho com outro grupo de amigas. E foi a melhor decisão. Eu adoro fazer bolos, os miúdos adoram ter visitas e, apesar de não estarem todas as pessoas que eu gostaria, foi mesmo bom estar com estas que são algumas das minhas pessoas especiais. Deu para pôr a conversa em dia, rirmos muito, partilharmos histórias, bebermos um belo gin alentejano e darmos abraços. A Lina chamou-lhe um "lovely get together", e foram mesmo isso, dois "lovely get together".
E uma curiosidade: tantas festas e não cantámos os parabéns. não foi uma decisão, aconteceu assim. eu não tinha velas, também ninguém se lembrou e não fez falta nenhuma. acho que isso só aconteceu porque estava mesmo feliz.
Obrigado, miúdas.
Estava a organizar as fotografias do verão e de repente...
Não bastavam as rugas, as peles caídas, os sinais, os milhentos sinais que me nascem todos os dias no rosto e nas mãos e por todo o lado. Nesta fotografia, tirada em julho, nota-se, como nunca, a cicatriz que fiz, acima dos lábios, quando tinha dois anos. Eu já tinha reparado que a cicatriz estava cada vez mais visível, como se a pele, à medida que envelhece, estivesse a perder a capacidade para ocultar os pequenos defeitos que temos. E, agora, aqui está a prova. Envelhecer também é andar para trás.
Foi em 1996. Há vinte anos terminei o curso. Há vinte anos comecei a trabalhar. Há vinte anos cheguei ao Diário de Notícias. Esta fotografia foi tirada há vinte anos e está aqui só para contrariar aquelas pessoas que me encontram na rua e gostam de dizer oh pá, estás nas mesma. Não, não estou. E isso é bom. Também é mau, mas é bom.