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Isto já começou há uns tempos, uma pessoa aqui e outra ali, mas acho que só agora estou a tomar verdadeira consciência do facto: estamos a chegar aos 50. Ainda no outro dia estávamos a fazer as festas dos 40, todas giras e frescas, a beber gin tónico e a dançar pela noite fora, a sentirmo-nos as maiores a meio da vida e a dizer que os 40 são os novos 30 e que bom que era, mesmo com uma ruga ou outra, termos esta dose de experiência e maturidade, lembram-se? Não sei muito bem o que aconteceu pelo meio - ou melhor, até sei, passaram dez anos e aconteceu uma pandemia e os filhos deixaram de ser crianças e começámos a perder as nossas pessoas e as hormonas desataram a fazer das suas e algumas de nós ainda sofreram mais uns quantos atropelos - mas sei que de repente estamos nos 50 e, não sei quanto a vocês, mas a meu ver isto parece-se exactamente como os 50 que são. Sem filtros nem melhoramentos.
Isso não é propriamente mau, atenção. É o que é. Não podes fugir, não te podes esconder, portanto, mais vale aproveitar muito bem enquanto aqui estamos, porque, como diz o Ivo Canelas, "isto passa a correr".
Duas coisas boas que a idade nos dá: uma consciência muito clara daquilo que nos interessa e a coragem de assumir isso mesmo, dizendo que "me estou a cagar" para o que não interessa (sejam os cabelos brancos, as opiniões dos outros, a marca dos sapatos ou as pessoas tóxicas à nossa volta).
É procurar as coisas boas, que as há sempre, até mesmo quando parece que não (isto sou eu a dizer a mim mesma, que me esqueço tantas vezes deste conselho básico) e dar muitos abraços a todas as pessoas que importam, porque as pessoas de quem gostamos e que gostam de nós são a única coisa que vale realmente a pena nesta viagem.
Este ano, três das minhas melhores amigas fazem 50 anos.
Foi a pensar nelas - e em todas nós, que já estamos ou que vamos a caminho dos 50 - que fiz esta playlist, com a mesma dedicação com que, na adolescência, enchíamos cassetes com as músicas que queríamos ouvir nas férias. São 50 canções cantadas por mulheres e, muitas delas, são também canções sobre mulheres. Havia outras mas a vida é feita de escolhas, não é? Estas são, sobretudo, canções de que gosto muito e, por isso, quero partilhá-las, assim em forma de prenda.
Estava à espera deles há algum tempo. São poucos mas estão aqui, bem na frente, impossível não vê-los quando me olho ao espelho todas as manhãs. Uns três ou quatro cabelos brancos que se destacam entre os mais escuros, a enquadrar-me o rosto, os primeiros de muitos, suponho. Só agora? Tens muita sorte, disseram-me. A sorte de nunca ter pintado cabelo. Houve uns momentos, quando era mais jovem, que tive vontade de ter o cabelo vermelho ou azul, mas nunca tive coragem. E para falar a verdade sempre gostei do meu cabelo preto. À medida que, à minha volta, amigas iam-se confrontado com os cabelos brancos, perguntava-me o que faria eu quando a minha altura chegasse. Iria pintar? Sempre achei que não. Irei pintar?, pergunto-me outra vez. Continuo a achar que não, mas quem sabe? A única coisa boa de envelhecer é estar cada vez mais nas tintas para o que os outros pensam e para o que é suposto uma "senhora da minha idade" fazer. Que se lixem as convenções sociais e as expectativas dos outros e os "alexandres pais" desta vida. Se me apetecer pintar o cabelo de cor-de-laranja, pinto. Se me apetecer ficar grisalha, fico.
O corpo é meu.
Se me acharem feia, não olhem. A gerência agradece.
Se vos apetecer comentar, fiquem calados, ou falem do tempo.
Sobre cabelos brancos escrevi AQUI.
Sobre esta pressão colocada sobre as mulheres e os seus corpos tenho escrito bastante, é só seguirem a tag Mulheres.
Sobre o texto execrável do Alexandre Pais, acho que há muito tempo que não sentia um nojo tão grande ao ler as palavras de alguém que não fosse o André Ventura. São três parágrafos de machismo, bodyshaming e idadismo. Uma pérola de boçalidade que julgávamos já não ser possível em 2023.
E ainda há quem me diga que as lutas feministas já passaram de moda. Quem me dera.
A propósito do Dia da Mulher, que amanhã se assinala: dois filmes que têm temas diferentes mas que, no fundo, falam da mesma coisa:
Ela Disse, de Maria Schrader, acompanha as duas jornalistas do The New York Times, Jodi Kantor e Meghan Thowey, que, em 2017, investigaram os abusos do produtor de cinema Harvey Weinstein. Durante anos, Weinstein, director da Miramax, usou a sua posição na indústria de cinema para abusar de jovens mulheres - algumas trabalhavam para ele, eram assistentes, secretárias, etc., outras eram actrizes no início de carreira. Lembro-me do quão enojada fiquei quando tudo isto se ficou a saber. Não foi uma nem duas vezes. Weinstein fazia isto por sistema, fê-lo muitas vezes (houve 107 mulheres que o acusaram, provavelmente haverá mais vítimas), e contava com a cumplicidade e a ajuda não só de outros trabalhadores (e trabalhadoras) como de grande parte do meio cinematográfico. É incrível percebermos como até há tão pouco tempo estes porcos abusadores podiam pavonear-se por aí impunemente, com a certeza de que ninguém teria coragem de os denunciar e que, se alguém o fizesse, bastava pedir aos seus caríssimos advogados para pagar o silêncio destas mulheres amendrontadas. Conseguir que essas mulheres falassem, conseguir derrubar o muro de silêncio em volta do assédio e dos abusos foi a grande conquista das duas jornalistas. E ver isso a acontecer neste filme é, para uma jornalista, quase como ver Os Homens do Presidente, o filme de 1976 sobre o caso Watergate - é lembramo-nos que existem jornalistas que de facto fazem a diferença e quão importante é o jornalismo quando é bem feito (depois há ali coisas que nós sabemos que não são bem assim, como, por exemplo, ninguém, e muito menos uma jornalista de investigação do NYT, faz telefonemas importantes para fontes ainda mais importantes enquanto se passeia numa rua de Manhattan ou enquanto entra no elevador do edifício da Oitava Avenida, mas, vá, a gente dá o desconto).
A Voz das Mulheres, de Sarah Polley, é um filme admirável por motivos totalmente distintos. O filme inspira-se nos acontecimentos na Colónia Manitoba, uma colónia de cristãos evangélicos na Bolívia, onde se descobriu que entre 2005 e 2009 um grupo de homens sedava as raparigas e as mulheres, com anestésicos para animais e, depois, durante a noite, as violava. As mulheres acordavam ensanguentadas e com dores mas na maioria das vezes não se lembravam com precisão do que tinha acontecido. Isso é da tua imaginação, disseram-lhes. Estás a inventar coisas. Ou então: isso é obra do demónio. Quando finalmente os homens foram apanhados no acto, a polícia foi chamada, concluindo-se que havia pelo menos cem vítimas, com idades entres os três (!) e os 65 anos. Oito homens foram acusados e condenados à prisão. O filme ficciona uma colónia semelhante, onde estes eventos ocorreram. Os violadores estão detidos a aguardar julgamento, os homens da colónia foram à cidade para tentar pagar as cauções, e as mulheres organizam-se para decidir o que podem fazer a seguir: perdoar e deixar tudo como antes; lutar (por quê? como?); partir, ou seja, abandonar a colónia. Têm apenas um par de dias para tomar essa decisão. O debate entre as mulheres, mais velhas e mais novas, solteiras e casadas, mais conservadoras ou mais progressistas, é um tratado sobre a condição feminina. E aquilo que ali se passa - algures, numa data indefinida, numa colónia religiosa, fundamentalista e fechada, que parece ter parado no tempo e viver ainda no século XIX - tem tudo a ver connosco. A influência da educação e da tradição naquilo que somos, os homens que não são todos iguais, as mulheres que também não o são, a violência doméstica, as questões transgénero, a masculinidade tóxica, a importância da religião, o poder - são tantas as questões que são ali abordadas. O que é a liberdade para quem nunca foi livre? Que escolhas temos? O que pode ambicionar quem não sabe ler, quem nunca foi à escola, quem nunca teve direito a ter opinião? Que voz é esta das mulheres quando finalmente se faz ouvir? Rooney Mara, Claire Foy, Jessie Buckley, Judith Ivey, Frances McDormand e todas as outras são maravilhosas. Este filme emocionou-me muito.
E, já agora, está patente até 23 de abril, no Museu de Serralves, no Porto, a exposição Metamorphosis, de Cindy Sherman. Esta também não se cala.
Quem vir o meu Instagram há de achar que a minha vida é um rodopio de comidas e festas, de espectáculos e passeios. É a chamada ilusão das redes sociais. Gosto de guardar naquele cantinho as coisas boas que me acontecem, algumas publicações quase sem explicação para os outros, só pequenas dicas para mim, para que um dia mais tarde, ao olhar para as imagens, me consiga lembrar: foi neste dia que estive com esta pessoa, foi neste sítio que me senti feliz. Um pouco como sempre fiz com os meus álbuns de fotografias, os meus álbuns que ultimamente tenho desleixado (mas ainda não perdi a esperança, ainda vou organizar estes últimos anos todos em álbuns, ainda vou!). Tenho esta pequena obsessão com a memória. Esta vontade de guardar tudo. Não coisas, não objetos. Guardar os pensamentos, os sentimentos, as sensações, as pessoas, os sítios, as vivências. E é também por isso que venho aqui escrever, talvez não tanto como gostaria, às vezes mesmo só porque sim, porque sei que a memória nos prega partidas e que, se não apontar aqui ou não publicar no Instagram, é provável que me esqueça e eu não quero esquecer a alegria que foi aquela noite com a Angel Olsen, ou aquele jantar com amigos, a maravilha do documentário sobre a Cesária Évora, a corrida para chegar horas ao "Perfect Match" dos Hotel Europa, o cansaço extremo que quase me fez sentar no chão a meio do concerto dos Bon Iver.
É que, feliz ou infelizmente, a vida não é só Instagram. A vida também é trabalhar, limpar a casa, dobrar meias, ir ao supermercado, fazer comida, arranjar marmitas, zangar-me com os putos, orientar estudos, pagar contas, ligar ao canalizador, mudar a areia do gato, ter insónias, pôr o despertador para as 6:30, arranjar ainda mais trabalhos. Há dias (semanas) em que julgo que não vai ser possível fazer tudo. Que me dói o ombro por causa das muitas horas ao computador. Que os olhos quase se fecham a meio de um texto que tenho de escrever. Que estou tão cansada que vai tudo corrido a pizzas e hambúrgeres e os putos começam a queixar-se que não têm roupa lavada. Que me vejo tão aflita que, mesmo com bilhetes comprados, só me apetece ficar embrulhada numa manta no sofá. Aconteceu-me na terça-feira. Atolada em trabalho, com o corpo moído e a cabeça feita em água, tive que inventar forças que não tinha para vestir um casaco e me meter no metro.
Ainda bem que fui.
E venho aqui escrever porque não quero mesmo esquecer a felicidade que senti por me ter sentado, numa cadeira apertada lá no cocuruto, num Tivoli lotado para ouvir as palavras sábias da Angela Davis e da Gina Dent. Angela, americana de 78 anos, militante de esquerda, anti-racista e feminista, pela igualdade de todos e pelos direitos civis, e, também, abolicionista. Gina Dent, que eu não conhecia até há poucas semanas, investigadora, activista e parceira de Angela. Que duas mulheres maravilhosas. Sensatas. Inteligentes. Curiosas. Atentas. Claras. Num mundo povoado por estrelas que vêm a "summits" debitar "talks" mil vezes repetidas e ensaiadas, é inspirador ouvir duas pessoas que têm tanto para dizer mas que também páram para ouvir, que perguntam, que querem saber. Que não mandam bitaites, apoiam-se em investigação. Que duvidam e põem-se a si mesmas em causa. E até dou de barato que tenham ideias polémicas ou utópicas. A igualdade e a liberdade para todos são, ainda, utopias. Imaginar um mundo sem sistema prisional e policial é de, facto, muito complicado, para nós que estamos aqui muito bem instalados na nossa vidinha, achando que as coisas são como são e pronto. "As prisões foram tão naturalizadas que nem pensamos que poderíamos existir sem elas", alertou Angela Davis. Mas, se não imaginarmos e se não pensarmos o que é que teremos de fazer para que a abolição seja possível, então é que nunca irá acontecer.
Angela Davis e Gina Dent lembraram que as prisões não existiram sempre. E é até engraçado perceber como as prisões surgiram como alternativa positiva em relação àquilo que existia antes: a condenação à morte ou os castigos físicos violentos. As prisões eram o sítio onde os criminosos esperavam pela condenação e passaram a ser a própria pena. Ela explica isso no livro Estão as prisões obsoletas?. Isto é tudo muito recente. Foi preciso primeiro estabelecer o direito universal à liberdade para que se considerasse que tirar a liberdade a alguém poderia ser um castigo em si mesmo.
Depois, questionaram: para que servem as prisões? Unicamente para castigar? Não. As prisões servem também, alegadamente, para manter as sociedades mais seguras. Para que a violência desapareça das nossas vidas. E estamos a conseguir cumprir esse objectivo? Nem por isso. "Se estamos a dar uma resposta a um problema, e falhamos, porque é que insistimos nessa resposta?", interrogou Angela Davis nessa noite.
"Há quem acredite que as prisões são sítios violentos porque os presos são violentos, mas na verdade as prisões são locais violentos por causa da violência do sistema prisional." A violência do encarceramento. A violência da força policial. A violência da existência de armas, da linguagem usada, das regras estabelecidas. E ainda sublinhou um outro facto: apenas uma pequena percentagem de pessoas está presa por crimes violentos. A maioria está presa por delitos menores, por reincidir, por desrespeito a regras (por exemplo, da imigração).
Perguntemo-nos, então: o que estamos a fazer - a nível social, educacional, cultural, político, económico, da saúde mental, da integração, da responsabilidade social - para prevenir a ocorrência desses delitos? O que estamos a fazer para reabilitar e reintegrar as pessoas que já passaram pela prisão, para que não voltem? Acreditamos mesmo que o nosso sistema prisional não se limita a ser punitivo, é também um sistema de empoderamento e de melhoramento dos indivíduos?
E podemos ir ainda mais longe, como ela vai: "Há pessoas que quando nascem já estão condenadas à prisão, são criminosos à nascença", disse. Porque existe o contexto e a desigualdade e todas as circunstâncias que nos moldam e condicionam. Porque nem todos os que cometem o mesmo crime têm a mesma pena. Porque existem crimes em relação aos quais somos mais condescendentes. Porque existem as questões raciais, culturais, de género, de nacionalidade, de classe. Porque existe a injustiça, o preconceito, o abuso de poder.
Por fim: as prisões existem e são cada vez mais e estão cada vez mais cheias porque existe um "sistema industrial de prisões", as prisões são já parte do capitalismo - dão lucro, dão emprego, fazem a "máquina" funcionar. É difícil acabar com as prisões da mesma forma que é difícil acabar com os combustíveis fósseis ou com a exploração laboral - porque há muita gente com muito a poder a ganhar muito dinheiro com isto.
Se calhar, disseram elas, "temos que repensar o que significa sentirmo-nos a salvo (safe) e sentirmo-nos em segurança (security)". Se calhar, temos que nos perguntar como é que lidamos com os problemas criados pelo capitalismo e em que mundo queremos viver? Se calhar, "não é preciso só abolir as prisões, é preciso criar uma nova sociedade, é preciso uma revolução". E, sim, sabemos que não vai acontecer já, mas podemos imaginar como é que seria viver num mundo assim, sem prisões, sem polícias, sem exércitos, sem guerras, sem armas, e podemos tentar começar por algum lado.
E eu nem estou a dizer que concordo com tudo o que ouvi. Teria que pensar mais amadurecidamente sobre o assunto para poder defender a abolição das prisões. Mas é tão bom questionar ideias feitas, é tão bom pensar e duvidar e procurar soluções. Sim, ainda bem que fui.
Estes são os livros que tenho de Angela Davis. Comprei propositadamente mas acabei por não conseguir ler o Abolition. Feminism. Now., porque me meti em trabalhos e tenho mesmo andado muito ocupada, mas, depois disto, fiquei ainda com mais vontade de lê-lo.
Se quiserem, podem ver a sessão com Angela Davis e Gina Dent AQUI.
Envelhecer é uma grande porcaria mas não há como evitá-lo, não é? Por isso, não adianta fechar os olhos e fingir que não está a acontecer (e deus sabe como eu gosto desta técnica de sobrevivência). Decidi enfrentar a realidade e fazer um artigo sobre a menopausa. Parti para este trabalho sem saber nada, só com esta ideia de que acho que é isto que me está a acontecer, como será com as outras mulheres? Foi um processo muito bom, pelas conversas que tive. Tive muita sorte com as minhas entrevistadas. E, depois, tem sido muito bom receber todas as reacções e mensagens de mulheres que me agradecem por ter falado neste tema, que me contam como se identificaram com as histórias ou que partilham comigo as suas histórias diferentes. Ah, então estás "nessa" fase? Sim, estou, chama-se perimenopausa (nem sabia que esta palavra existia) e é uma grande confusão, uns dias sinto-me um caco, como se já tivesse 90 anos, noutros estou imparável e disposta a tudo para combater a apatia.
O texto não tem pretensões de dar explicações científicas ou apresentar respostas milagrosas. Mas tem uma mensagem que me parece muito importante, para mim e para toda a gente. Se quiserem ler, está aqui:
O filme chama-se Boa sorte, Leo Grande e está nos cinemas. Nem tinha ouvido falar dele, de tão desligada que ando das estreias dos filmes, mas uma amiga desafiou-me, eu perguntei é sobre o quê?, ela respondeu que a Emma Thompson faz de uma mulher que nunca teve um orgasmo e eu disse logo que sim, quero. A Emma Thompson tem 63 anos e ali, naquele quarto de hotel onde se passa quase toda a acção, ela é Nancy Stokes que é, na verdade, a professora Mrs. Robbinson (com todas as imagens que esse nome ecoa em nós). Uma mulher que, como todas as mulheres, cresceu a ser ensinada a ter vergonha do seu corpo, a escondê-lo e a controlá-lo. Porque é isso que as mulheres como deve ser devem fazer. E que, uma vez viúva, percebe que viveu uma vida inteira sem prazer, não é só sem nunca ter tido um orgasmo, é sem ter tido prazer, sem nunca ter experimentado o desejo, sem saber como é deixar-se ir guiada só pelo que o corpo quer, sem pensar. É um filme sobre as mulheres e os seus corpos, sobre o envelhecimento e o tal do aceita-te a ti mesma, sobre isto, em que eu insisto tanto, da necessidade de sermos nós mesmas, sem dar cavaco ao que os outros pensam.
Boa sorte, Leo Grande é realizado por Sophie Hyde, que eu desconhecia, e, além de Emma Thompson, conta com Daryl McCormack, de 29 anos, que é um belo pedaço de mau caminho mas, acreditem, não é (só) por isso que vale a pena ir ver este filme.
Ideal para rir e chorar e depois ficar horas na conversa com uma amiga, de preferência a beber uma óptima sangria de frutos vermelhos. A melhor terapia de sábado à noite.
Queria ter escrito um texto bonito sobre a Serena Williams mas não tive tempo. Ainda assim, não queria deixar de vir aqui dizer que foi muito bom ter podido acompanhar a carreira dela, praticamente desde o início. A garra dela. A vontade de ganhar. A individualidade. A maneira como desafiou os estereótipos. As muitas roupas e polémicas. E, sim, a forma como jogava também. Grande. É pena ter perdido mas foi uma bela despedida.
Foto de Frank Franklin II/AP
Vejam aqui um pouco da história de Serena Williams.
Esta podia ser eu, hoje, a desesperar com o calor.
Isto é só para lembrar que todes temos "corpo de praia". É o corpo que temos e de mais não precisamos.
A fotografia é de Robbie McIntosh, street photographer italiano, de Nápoles. Podem ver mais no seu Instagram.
Não sabia quem era a Georgia Pritchett. Nunca vi Succession nem Veep. Mas mesmo que tivesse visto, provavelmente não saberia quem era porque eu não sou essa pessoa que sabe os nomes dos argumentistas das séries. Não sabia quem era a Georgia Pritchett mas não consegui deixar de reparar no título do livro: My Mess is a Bit of a Life. Encontrei-o no meio de outros "livros de mulheres" (a minha secção favorita nas livrarias, nos dias que correm, a par das biografias) na Cook & Book, uma livraria extraordinária em Bruxelas. Não sabia quem era a Georgia Pritchett mas bastou-me ler o título e a contracapa para decidir trazê-lo. Foi assim que descobri esta mulher, argumentista, humorista, lésbica, mãe, pessoa com vários problemas de ansiedade e outro tipo de problemas. É um livro despretencioso, verdadeiro e ficcional, divertido e angustiante ao mesmo tempo. Vou pô-lo na estante ao lado da Tati Bernardi (Depois a Louca Sou Eu e Você Nunca Mais Vai Ficar Sozinha) e da Norah Ephron (I Feel Bad About My Neck: And Other Thoughts on Being a Woman). Se repararmos bem, é incrível a quantidade de mulheres que escrevem com humor sobre si próprias ou sobre outras mulheres muito parecidas, quase como uma catarse. Gostaria muito de saber fazer isso. De conseguir distanciar-me. De encontrar as palavras. De não temer o ridículo. De tornar-me numa outra, quem sabe talvez para poder revelar-me eu mesma.
O número de Interrupções Voluntárias da Gravidez (IVG) pode ser usado como critério de avaliação da eficácia do planeameno familiar. Menos IVG correspondem a um planeamento mais eficaz, dizem os senhores que mandam.
E se fizéssemos a contabilidade de todas as pessoas que tiveram filhos porque não têm informação suficiente sobre reprodução e contracepção ou porque o parceiro não quis usar preservativo ou porque são elas que não gostam de usar preservativos, pessoas que tiveram filhos porque fizeram mal as contas, porque falharam a toma da pílula ou porque não conseguiram comprar uma pílula do dia seguinte, pessoas que tiveram filhos por acidente, um daqueles descuidos e agora já foste, pessoas que tiveram filhos por vergonha ou medo de fazer um aborto ou porque o companheiro se opôs ou porque alguém as intimidou. Filhos que não faziam parte dos planos.
E que, na verdade, não são grande exemplo da eficácia do tal do planeamento familiar.
(Nem sei se vale a pena comentar as declarações muito despropositadas da nossa ministra da saúde que diz que a IVG é um direito, assim como fumar. No sentido em que são coisas que as pessoas fazem porque querem, mesmo sabendo que são prejudiciais. Tal e qual, não é?)