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20
Mar22

Fantasmas

Ghosting. Não sabia o que era até há uns tempos. Uma amiga disse-me: "Deram-te ghosting". E eu fui à internet procurar. Ghosting. Parece que isso existe mesmo. É uma cena identificada, definida pelos dicionários urbanos e explicada pelos psicólogos. Ghosting é quando uma pessoa desaparece da tua vida sem dar qualquer explicação. Toma chá de sumiço, como se diz na minha terra.

Foi isso que fez o Zé Pedro. Um rapaz simpático, querido, culto. Conhecemo-nos na aplicação, falámos no whatsapp, conversámos ao telefone. Fomos tomar um café numa manhã de sol num desses sítios hipsters num bairro histórico de Lisboa. Depois fomos beber um gin e ver o pôr-do-sol junto ao rio. Depois fomos jantar num restaurante pacato. Depois fomos à praia. Era junho. A vida corre-me sempre melhor no verão, quando os miúdos estão de férias e os dias são compridos e parece que o tempo dá para tudo. Durante três meses fizemos companhia um ao outro. Fomos ao teatro, vimos filmes no sofá, passeámos o cão, fomos ver uma exposição, cozinhámos jantares e até fomos ao Algarve. Era bom ter alguém com quem fazer programas ao fim-de-semana e adormecer em conchinha. O Zé Pedro tinha lá as suas coisas, como toda a gente tem, mas era carinhoso e de esquerda e gostava de música alternativa. Não estávamos perdidamente apaixonados e não fizemos juras de amor nem nada que se parecesse mas tínhamos um entendimento de que continuaríamos a encontrar-nos enquanto fosse bom. Depois, chegou o outono e ele ficou muito ocupado. Hoje não, amanhã não sei. Até que um dia disse: passo aí ao meio-dia. E não passou. E não respondeu às mensagens. E não atendeu o telefone. Nunca mais. Eu, que não estava nada familiarizada com isto do ghosting, achei que o rapaz tinha tido um piripaque qualquer, fiquei morta de preocupação, fui lá tocar-lhe à campainha e já estava disposta a ir procurar a família para lhes dar os pêsames quando ele, provavelmente assustado com a minha insistência, decidiu descansar-me com uma mensagem que dizia qualquer coisa como "desculpa, tive uns problemas para resolver, depois falo contigo". Não falou. Mas eu entendi a mensagem. Não lhe tinha acontecido nada. Ele simplestemente não queria falar mais comigo.

"Deram-te ghosting", disse-me uma amiga.

Ainda nos rimos um bocado à conta desta história. 

Os anos passaram. Não faço ideia o que aconteceu ao Zé Pedro. Se conheceu outra pessoa, se estava com medo que eu o pedisse em casamento, se simplesmente estava farto de mim. Matutei um bocadinho na coisa, na altura, porque odeio não compreender algo. Gosto de pôr tudo em pratos em limpos, sem dúvidas nem zonas cinzentas. Por isso, custou-me admitir que há adultos com mais de 40 anos que não têm maturidade para chegar ao pé de uma pessoa e dizer: "olha, não quero mais". Não me parece complicado. E eu entenderia. 

As pessoas são estranhas.  

publicado às 12:22


4 comentários

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Mena 08.04.2022

Com saber de experiência feito, digo-te que eles voltam e dizem que têm saudades... E é tão "deprimente" que a sensação de "gostava de perceber" passa num ápice
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Gata 11.04.2022

ah ah ah ah ah ah
um beijinho!
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Maria Blanco 19.04.2022

Há muito que não passava pela tua casa! Voltei e deu-me a saudade - assim por esta ordem (O desemprego tirou-me horas à frente do pc e esqueci-me das leituras dos blogs que ainda persistem e de que tanto gosto)
Sobre este Zé Pedro, peço já desculpa pelo francés, mas PQP!!! Não há pachorra para homens (e pessoas em geral) mal resolvidas ou pouco frontais, cobardes mesmo. Grassa uma imaturidade emocional que menos se entende e admite em pessoas com mais de 40! E prontosss, mais vale mesmo só que com trastes destes
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Gata 20.04.2022

Bem-vinda de volta, Maria. Ainda persisto, mas é verdade que já somos poucos... também tenho saudade de ler os meus blogues preferidos, não me conformo com o instagram onde é tudo tão descartável. Tenho instagram e adoro mas não me chega.
Um beijinho grande e boa sorte (para o desemprego e para o resto).

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