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Fiquei curiosa sobre o Maradona depois de ter estado em Nápoles e de ter visto a admiração que aquela cidade tem pelo futebolista. Não fazia ideia. Na altura, o Maradona passou-me um bocado ao lado. Eu era miúda e não acompanhava muito a bola e, confesso, na final do Mundial de 1990, que foi mais ou menos quando comecei a gostar de futebol, estava a torcer pela Alemanha. Primeiro, porque eu estudava alemão e o meu liceu tinha um intercâmbio com uma escola em Dortmund que me levou a andar de avião pela primeira vez na vida, portanto, estava numa fase em que até comia salsichas com chucrute e kartoffelsalat; e, depois, porque aquele homem pequenino, atarracado e de penteado piroso não poderia nunca competir com o Lothar Matthaus, não é?

Ontem, que foi o dia de aniversário de Maradona, passou num canal qualquer um documentário sobre o jogador. É um filme realizado por Asif Kapadia, o mesmo que fez os documentários sobre a Amy Winehouse e o Ayrton Senna, usando as milhentas imagens de arquivo, muitas delas de vídeos caseiros. Pus-me a ver. O Maradona a correr que nem um touro selvagem contra tudo e contra todos, a inventar fintas, a passar por entre os adversários e a marcar golos atrás de golos. Parecia imparável. O filme acompanha sobretudo os anos da sua passagem por Nápoles, a relação com a cidade e com a Camorra, a infância pobre e a concretização de sonhos nunca sonhados, as vitórias, o relógio de ouro e o casaco de peles, o filho que não reconheceu, o golo com a mão, as festas e as mulheres, a cocaína, a mulher que aturou isto tudo desde que se conheceram quando eram ainda jovens e pobres, o modo como passou de adorado a odiado pelos italianos. É impressionante também a transformação provocada pelo vício, toda a decadência física. Diego Maradona nunca foi um "menino bem comportado", nem dentro nem fora do relvado. 

A propósito, o Bruno Vieira do Amaral partilhou ontem, no Facebook, um texto sobre o Maradona, onde diz: "Não se pode comparar a nenhum jogador de futebol, por muito talentoso, competente e vitorioso que seja, porque foi muito mais do que um jogador de futebol. Sozinho, personificou a abundância de talento, a criatividade desmesurada e a desgraça previsível de todo um continente. A sua vida foi um épico, uma tragédia e uma farsa, muitas vezes ao mesmo tempo. Foi rei e bobo da corte. (...)  o único território que Diego alguma vez reclamou foi o do coração dos adeptos e o seu único poder era o amor que lhe tinham. Pode-se discutir o que se quiser sobre a qualidade futebolística, comparar títulos e estatísticas, usar argumentos como quem usa floretes, mas ninguém de boa-fé pode contestar uma verdade evidente: nenhum futebolista foi tão amado quanto Maradona."

Também vale a pena ler o que o Marco Vaza escreveu no Público (para assinantes) a propósito da sua morte em 2020.

Continuo sem entender a idolatria, não entendo nenhuma idolatria. Mas deu para conhecer um pouco melhor Diego Maradona. Após a vitória no Mundial do México, o jogador deu uma entrevista televisiva no quarto onde tinha passado o último mês: nas paredes, mostrou orgulhoso, tinha uma fotografia da namorada, uma imagem da Virgem Maria e um poster de uma pin-up em nu frontal. Acho que é um bom resumo.

publicado às 23:47



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