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Quando releio o que por aqui publico lembro-me sempre da minha mãe: "não páras no armeiro"*, costumava dizer. De onde ela me via, a minha vida parecia uma enorme agitação, como se eu nunca parasse em casa e tivesse sempre mil programas. A verdade não é assim tão interessante. Sou mãe sozinha há [precisamente] doze anos, praticamente sem descanso. O meu dia-a-dia é feito de muitas rotinas, de muita louça suja, máquinas de roupa, almoços e jantares, marmitas e compras, ralhetes e preocupações, muitas noites solitárias. Por isso, não se deixem enganar pelas redes sociais, a vida real é outra coisa. Mas, sim, tenho a imensa sorte de ter um trabalho que, nos dias bons, me proporciona muitas alegrias. E, sim, à medida que o tempo passa e que os rapazes crescem, os fins-de-semana deixaram de ser ocupados com festas de aniversário, tabuadas e jogos de futebol, e passaram a ser cada vez mais meus, o que me permite fazer muitas coisas fixes, sobretudo, ir ao teatro e ao cinema, estar com amigos, passear. O que é bom, claro, mas também é um sintoma. Dentro em breve (em breve significa ainda uns anos) não será só ao fim-de-semana. O ninho irá ficar vazio, mesmo que eles fiquem por aqui, se é que me entendem. Se tudo correr bem, não faltará muito para que não haja mais marmitas nem ralhetes (as preocupações, estou em crer, não hão de passar nunca), com tudo o que isso tem de bom e de mau, o que não é novidade nenhuma, não faltam por aí estudos sobre o "síndroma", diz que não é fácil para nenhuns pais e mais difícil se torna quando não há um casal. Olhamos para o lado e, de repente, não está lá ninguém. Não é a primeira vez que falo deste assunto. A solidão é uma realidade. Está presente todos os dias. E sei que tem tendência para se adensar, se não a combater. Por isso, estou a preparar-me. Lentamente. O desafio é encontrar este equilíbrio entre o desfrutar o meu tempo sozinha mas não me deixar deprimir, entre o este fim-de-semana apetece-se ficar no sofá a ler e a ver filmes mas no próximo já tenho a agenda cheia. Tenho outra sorte, que é a de ter amigos muito especiais que vão cuidando de mim, às vezes sem o saberem, "mensajando-me", convidando-me, aturando-me, desafiando-me, não desistindo de mim mesmo quando eu lhes dou negas (e dou muitas). [Fui ver agora e este foi o primeiro post que publiquei depois da separação]. Acredito profundamente que somos mais felizes quando somos-com-outros, quando nos damos, quando recebemos, quando partilhamos - nem que seja partilhar o silêncio (é tão bom quando encontramos alguém com quem conseguimos partilhar o silêncio).
Este ano faço 50 anos. Há [exactamente] doze anos que me separei. Há pouco mais de três anos mudei de emprego. Ainda no outro dia fiz novos amigos. Continuo a fazer coisas pela primeira vez (e há tantas ainda por fazer). É incrível perceber a quantidade de vidas que já vivi neste meio século, como as coisas mudam e nós mudamos com elas, como nunca poderemos prever com exactidão o que vem a seguir. É assustador mas, ao mesmo tempo, essa a beleza da vida, não é?
* não faço ideia de onde vem esta expressão, se alguém puder explicar ficarei bastante agradecida
A nossa casa está a precisar de uma intervenção. Andamos há anos a adiar. Porque uma pandemia, porque a inflacção, porque aquela empresa de obras afinal não é tão boa como parecia. Agora, finalmente, parece que já encontrámos uma pessoa de confiança que nos pôs em lista de espera. Uma questão de meses. Mas o destino, caprichoso, decidiu fazer das suas. A cama do António partiu-se. Ao fim de mais de 15 anos, aquele beliche fantástico, com armário e gavetas, o beliche mais fixe que havia no mercado e ainda por cima ideal para o espaço que tínhamos, o beliche comprado numa loja em Almada depois de grande pesquisa (a loja chamava-se Just4Kids e acho que já não existe, o beliche era mais ou menos assim, mas tinha mais umas gavetas pequenas), e que já tinha começado a mostrar sinais de cansaço, partiu-se. A substituição era urgente, não podia esperar meses. Decidimos, portanto, antecipar a remodelação do quarto. O que implicou retirar todos os (muitos) livros infantis que ainda lá estavam e as duas gavetas cheias de brinquedos que tinham resistido à última arrumação. O que implicou limpar primeiro a marquise, para lá acomodar uma estante. O que implicou arrumar uma parte do grande armário de parede, para lá guardar algumas das coisas que queria guardar. E já agora a despensa. E os armários da cozinha. E as pastas dos papéis. E as gavetas da roupa. Foram dias nisto. Separar o que era para manter, o que era para dar, o que era para o lixo. É impressionante a quantidade de lixo que guardamos. Coisas que não servem para nada, que achamos que poderão servir mas na verdade são inúteis. Perdi a conta aos sacos de lixo que enchemos, às viagens que fizemos até aos contentores. Os miúdos colaboraram. E no momento de pintar o quarto foram eles que meteram mãos à obra. Não ficou perfeito, mas ficou feito. Também é verdade que esta gente se farta depressa, pinta uma parede e depois acha que já está, que não é preciso limpar o chão nem a janela, arrumar tudo. Enfim. Andei entretida, foram umas férias um pouco diferentes.
No dia em que os senhores vieram para desmontar o beliche, os miúdos ficaram um bocadinho nostálgicos. Mas, depois, fomos ao ikea, eles escolheram móveis, tapetes, almofadas. Montaram tudo com a dedicação de quem está a fazer algo que quer muito, algo pela primeira vez ao seu gosto. Um quarto ficou pronto, o outro ainda está a meio, mas já é outra coisa, em vez de um quarto de crianças e um escritório temos agora dois quartos de gente crescida, de rapazes que já não brincam com legos mas que passam horas estendidos nas camas grandes a falar ao telefone. Eles estão felizes por ter espaços só seus. Trazem amigos, fecham as portas, ouvem música, dizem parvoíces, namoram, fazem o que lhes apetece. A dinâmica da casa mudou completamente, nem consigo explicar bem. Mudámos um quarto e, de repente, é como se nos tivéssemos despedido definitivamente dos últimos resquícios da infância.
É setembro. Está calor e depois chove, o pai fez anos, esta semana é a feira da minha terra, não tarda começa o novo ano lectivo, os putos precisam de sapatos novos. Eles crescem. É a vida a acontecer, tal e qual como se espera que aconteça.
Não há teenblogs. Há muitos babyblogs - textos e mais textos e fotos e mais fotos sobre essa coisa avassaladora que é ser mãe e sobre as mil peripécias, boas e más, dos filhos. Mas não há teenblogs. A partir de uma certa altura, não dá para dizer exactamente quando, não há uma regra, as vidas dos filhos deixam de nos pertencer, já não podemos dispor delas quando nos apetece, muito menos expô-las ao mundo. É uma coisa que sentimos mas também pode acontecer (como me aconteceu) que os filhos nos peçam privacidade. Não querem que publique as suas fotos e não gostam de ser assunto de conversa. É justo. Além disso, parece-me, não há teenblogs também porque é difícil falar sobre esta culpa que nos consome por eles não serem exactamente como nós sonhámos. Falo por mim, claro: passo horas a cogitar o que possa ter feito de tão errado para os meus filhos não serem perfeitos e a desfazer-me por dentro com a culpa de não saber como agir, quais as palavras certas, o que poderei ainda fazer para correr atrás do prejuízo. Ainda irei a tempo?
Um dia vou escrever sobre isto, provavelmente quando tudo já tiver passado, para o bem ou para o mal.
Talvez por isto tudo tenha gostado tanto deste Desvio, o livro de Ana Pessoa e Bernardo P. Carvalho. Saibam mais AQUI. É mesmo bom, garanto-vos.
No outro dia fomos ao cinema ver o 1917. Eu e os meus dois filhos.
É engraçado. Para o António ir ao cinema não é sequer uma hipótese de programa com os amigos. Os amigos servem para jogar à bola ou playstation ou para ficarem horas a fio na conversa, a dizer parvoíces e a deambular por aí. Ir ao cinema? Eles estão habituados a ver os filmes e as séries nos telemóveis (ou, na melhor das hipóteses, no computador), com phones nos ouvidos, sozinhos. É uma experiência completamente diferente da que eu tive, quando ir ao cinema ao sábado à noite era não só a única maneira de ver algum filme como era também a única coisa que havia para fazer com os meus amigos. Já para estes miúdos, ir ao cinema é um desperdício de tempo útil com os amigos (certamente porque ainda não descobriram as maravilhas do "escurinho do cinema") e um desperdício de dinheiro. Uma pessoa argumenta com a qualidade da imagem e do som mas não é fácil. Talvez tenham de crescer mais um pouco.
De maneiras que, por agora, parece que ir ao cinema é um programa com a mãe. Uma coisa de cota. Que seja. Não me parece mal se isto se tornar "a nossa coisa em conjunto". Apesar de cada vez ver mais filmes em casa (é inevitável) eu gosto muito de ir ao cinema. E mal posso esperar pelo momento em que poderei ir com eles ver todos os filmes. Neste momento estamos numa fase complicada. O António já poderia ver tudo mas o Pedro ainda só tem 11 anos - ele é um valente e não protesta nem mesmo quando numa das nossas noites de cinema em casa vemos o Platoon e ele não percebe grande parte do que se passa. Mas, ainda assim, não convém exagerar. Gostou do 1917, não se queixou nem se aborreceu, mas pediu para da próxima vez irmos ver um filme "de acção". É justo.
Isto tudo é só um pretexto para dizer que o meu filho mais velho fez 16 anos. Ele não gosta de tirar fotografias e mesmo quando me deixa fotografá-lo não me deixa partilhar as fotos. E também não gosta muito que eu escreva sobre ele. Tenho que respeitar. Por isso só posso dizer-vos isto: o meu filho fez 16 anos e tem sido o maior desafio da minha vida. Em bom e em mau. Aliás, isto de ser mãe sozinha de dois rapazes tem sido uma aventura e pêras, uma daquelas coisas que só quem passa por elas é que pode entender. Um dia, quando isto tudo passar, talvez vos conte.
Por agora fiquem a saber que fomos ao cinema os três ver um filme de adultos. Não foi a Velocidade Furiosa nem o Homem Aranha. Foi um filme de crescidos, escolhido por mim. E isso, parecendo tão pouco, deixa-me muito feliz. São assim, tontas, as mães.
Na primeira vez em que fomos de férias a três eu estava um bocadinho ansiosa. O António tinha 9 anos, o Pedro 5. Eu já estava há mais de um ano sozinha com eles mas nunca tínhamos estado assim, umas três semanas por nossa conta, longe de casa, a inventar programas e a aturar-nos 24 horas por dia. Acabou por correr tudo surpreendentemente bem. Muito melhor do que eu poderia imaginar. De então para cá, já tivemos muitas férias diferentes. Umas vezes juntando-nos com amigos. Outras vezes só nós. Umas vezes indo mais longe, outras ficando mais perto, umas vezes por muito tempo, outras só uns dias. Mas sempre com um lema: no stress. Como o nosso dia-a-dia é geralmente feito de horários e pressões, as férias tornaram-se uma oportunidade única para estarmos sem grandes compromissos e para desfrutarmos ao máximo da companhia uns dos outros com o mínimo de discussões e muita leveza. É mesmo só isso que procuro. E tem sido muito bom.
Entretanto os putos foram crescendo, o que facilita muito a parte logística mas levanta outro tipo de questões. Este ano, pela primeira vez, temi que as coisas não corressem tão bem. Afinal, o adolescente está numa fase complicada, naquela fase em que tudo é um aborrecimento, sobretudo tudo o que envolva a mãe (seca) e o irmão mais novo (mais seca). Além disso, tinha que se afastar da sua querida playstation e (oh, o horror) passar a maior parte do tempo sem wifi. Respirei fundo e lá fomos. E não digo que foram as melhores férias de sempre nem que não houve ali uns momentos de tensão. Mas foi muito melhor do que eu estava à espera. Sem grandes dramas a assinalar. E houve até momentos em que deu para sentir aquela emoçãozinha por ainda conseguirmos fazer isto de estarmos juntos e sermos felizes os três com coisas simples como jogar às cartas ou ficarmos deitados todos numa cama a conversar ou até só numa ida ao supermercado para comprar o jantar. Foi talvez o ano em que passámos mais tempo sem fazer nada. Foi o ano em que estivemos mais tempo no Alentejo com a família. Foi o ano em que os putos dormiram quase sempre até ao meio-dia. Foi definitivamente o ano em que passámos menos tempo na praia (e em que cheguei ao fim menos bronzeada do que é habitual). E no entanto, parece-me, não poderia ter sido melhor. Era exactamente isto que eu precisava. Até porque, sinceramente, acho que cada vez preciso de menos. Basta-me ficar a olhar para eles a dar mergulhos, felizes. Posso ficar assim durante horas. E eles também.
2013
2014
2015
2016
2017
2018
2019
(Porque nem tudo é perfeito: o António está na fase "no photos". No ano passado, já tinha sido uma selfie tirada a ferros, este ano não sei sequer se tenho alguma foto decente dele na máquina. Mas tenho esta, que é muito representativa dos meus putos,)
Gosto muito de nós nas férias. Estes são os momentos e os sentimentos que temos de guardar. É a esta felicidade que viremos beber ao longo dos próximos meses quando estivermos cansados e zangados, quando nos odiarmos, quando tudo estiver a correr mal e quando sentirmos vontade fugir.
Só temos que nos lembrar que não tarda nada é verão outra vez.
Eles crescem e fica tudo mais fácil? Nem tudo. Tirá-los de casa, por exemplo, é muito mais difícil. Há uns tempos, bastava-me dizer vamos ali ao parque jogar à bola e assim, com umas horas passadas no parque das nações ou no jardim das conchas, resolvíamos a tarde de sábado e éramos todos felizes. Agora, o Pedro ainda alinharia na boa num programa desses mas para isso precisava do irmão porque ir ao parque sozinho com a mãe não é lá muito divertido. E o irmão... o irmão tem 15 anos e já não acha muita piada a ir ao parque com o mano mais novo. Portanto, este é um dos meus novos desafios: encontrar programas que agradem aos dois. Sobretudo: encontrar programas que agradem a um adolescente e que o tirem de casa sem ser obrigado (eu obrigo, de vez em quando, sei que não é a melhor maneira e que as mães perfeitas arranjam sempre uma maneira melhor mas eu não sou uma mãe perfeita e por vezes tem mesmo que ser).
Um truque: convidar amigos deles.
Melhor ainda: combinar com amigos deles cujas mães são minhas amigas. Ou com amigas minhas cujos filhos têm idades parecidas aos meus.
Às vezes conseguimos. E até conseguimos ficar na praia até ser noite. Mas é só às vezes.
2006
2015
Hoje o António fez 15 anos e caiu nas escadas do prédio. No hospital, onde fomos só por prevenção, para termos a certeza que as dores eram só dores e não havia ossos partidos, disseram-nos que ele já não podia ir para as urgências pediátricas, que aos 15 já se vai ao médico dos crescidos. E foi ali, enquanto pagava 40 euros para esperar uma hora e meia por uma consulta de 10 minutos e sair de lá com uma receita de benuron e emplastro para as costas, que olhei de esguelha para o meu filho, um magricelas da minha altura com a cara cheia de borbulhas e os olhos permanentemente enfiados no telemóvel, e quase me emocionei. Quinze anos, caramba. E eu ainda tão à nora como quando o trouxe para casa da maternidade e mal sabia trocar uma fralda. Quinze anos, caramba. E ele ainda com o mesmo sorriso maroto. Tão lindo o meu filho de quinze anos. É uma peste, claro. Mas é a minha peste. O amor que temos pelos filhos é das coisas mais inexplicáveis e extraordinárias do ser humano.
Voltámos das férias para comprar sapatos. Literalmente. No primeiro dia, o António foi ao treino de futebol e, a meio, teve de tirar as meias porque lhe começaram a doer os dedos dos pés. Isto numas chuteiras compradas em fevereiro e que na altura até eram mais para o grande. Mas não são só os pés que estão maiores. Também a roupa deixou de servir e obrigou-nos a arrumações profundas das gavetas e armários. Eles estão mais altos, mais esguios, mais crescidos de muitas maneiras. Este verão deliciei-me a vê-los de longe a brincar e a conversar com os amigos, a saltar ondas grandes e a deslizarem por escorregas gigantes, saindo de casa sozinhos para ir às compras ou para comer um gelado, ficando em casa sozinhos sem quaisquer problemas. As férias são também momentos de grande liberdade. Em que, todos juntos, em bando, os miúdos exploram o mundo à sua volta, seja a jogar às cartas num quarto no último andar da casa ou num passeio até ao fundo da praia - sempre cada vez mais longe dos pais. Mais independentes - para o bem e também para o mal, pois claro. Adoro vê-los crescer na mesma medida em que me assusta pensar em tudo o que pode correr menos bem. Além disso, como acabei de descobrir, os sapatos tamanho 40 são muito mais caros do que os 38.
No sábado, fomos a uma sessão do festival Indie Junior: dois filmes mudos (um filme russo e outro de Buster Keaton) acompanhados por duas baterias. Preparei-me para o pior. Expliquei-lhes que eram filmes do início do cinema, a preto e branco e sem falas. E para os animar garanti-lhes que não demoraria uma hora sequer. Eles suspiraram daquele jeito como quem diz "as coisas que temos que aturar a esta mãe", mas não protestaram nem amuaram, portaram-se bem, estiveram atentos, riram-se e, no final, até disseram que tinha sido fixe e comentaram (e imitaram) as partes mais engraçadas.
Na segunda-feira, o Pedro foi com a escola a uma outra sessão do Indie Junior. Ao fim do dia queixou-se: "Eram filmes infantis, mãe, não teve graça nenhuma."
O puto ainda não tem 10 anos mas já não gosta de ver bonecos.
Confirma-se: os segundos crescem muito mais depressa.
Ter um filho adolescente é como ser mãe pela primeira vez, outra vez. Nada nos prepara para isto. As crianças têm 10 anos e uma pessoa acha que já sabe mais ou menos com o que pode contar, que já dá conta do recado, que isto de ser mãe se calhar não é assim tão difícil, julgamo-nos o melhor condutor do mundo e, no entanto, lá vem a adolescênca para nos trocar as voltas. 13 anos. Aquela criança linda e amorosa transforma-se, de repente, numa pessoa que mal conhecemos, uma pessoa de phones nos ouvidos e os olhos pregados ao telemóvel, que tanto nos derrete com as suas conversas queridas e com o seu sentido de humor como diz umas parvoíces enormes e é tão mal educado que temos que nos controlar para não lhe dar um belo par de estalos. É como ter um estranho em casa. Dou por mim a perguntar: onde está o meu filho? Os adolescentes fazem coisas como soprar quando os mandamos arrumar a roupa, dar respostas tortas, mentir quando não lhes convém dizer a verdade, amuar quando os obrigamos a fazer programas de família, não estudar, ouvir músicas horríveis, desafiar a autoridade dos pais, ignorar o que lhes dizemos, estar-se nas tintas para o mundo, teimar que estão certos, ser ainda mais mal educados. Pelo meio também fazem coisas boas, é claro. Mas em muito menos quantidade. Ter um filho adolescente é muito mas mesmo muito mais difícil do que ter um bebé, e eu sei que isto é um cliché mas não é por isso que é menos verdade. Porque nós sabemos que os bebés crescem rapidamente e, com mama ou sem mama, com chucha ou sem chucha, com mais ou menos histórias ao fim do dia, desde que a gente esteja ali a tomar conta deles, desde que haja colo e comida e amor tudo irá ao lugar. Já quanto aos adolescentes aquilo que sinto é que posso mesmo estar a fazer tudo errado e que os erros que eu cometer agora poderão ter consequências mesmo graves no futuro. Estamos permanentemente na corda bamba. E nunca se sabe o que poderá acontecer. É uma sensação horrível. Mas continuarei a dar o meu melhor, que é a única coisa que posso fazer.
Não tenho soluções milagrosas. Vou errando. Vou aprendendo. Continuo a errar.
Sei que não estou sozinha nisto. O que não me ajuda mas dá-me algum alento.
E tento sempre lembrar-me que se isto é mau para mim, para ele também não deve ser nada fácil. Afinal, estamos juntos nesta montanha russa de emoções e hormonas descontroladas.
É sobre isto tudo que fala o espectáculo Montanha Russa, de Miguel Fragata e Inês Barahona, que se estreia esta semana no Teatro Nacional D. Maria II, em Lisboa. Eu vi um ensaio mas gostei tanto que já reservei bilhetes para ir ver de novo e levar os meus miúdos. Aconselhado a adolescentes e a pais de adolescentes. E ainda que não tenham nada a ver com adolescentes podem ir ver à mesma porque é um espectáculo muito fixe, com boa música, bons actores. Que nos diverte. Que nos faz pensar. Que nos faz voltar aos nossos 13 anos.
Fotografia de Nuno Fox/ Agência Lusa